Título: Sem-terra do MST negociam lotes no Sul
Autor: Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 05/05/2009, O País, p. 5

De 183 assentamentos no estado, 147 estavam em situação irregular, com quase todos os lotes com arrendatários

SÃO PAULO. Famílias de sem-terra assentadas no Rio Grande do Sul estão vendendo ilegalmente lotes que receberam da reforma agrária. A pedido do Ministério Público Federal naquele estado, a Justiça ordenou o despejo das pessoas que comercializam as áreas, como mostrou reportagem do "Bom Dia Brasil", da TV Globo, ontem. O Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) está retomando os lotes em poder dos arrendatários.

Somente no segundo semestre do ano passado, dos 183 assentamentos analisados, 147 estavam em situação irregular, com quase todos os lotes nas mãos de arrendatários. Pelo menos 22 dessas áreas já foram retomadas pela União.

Com uma câmera escondida, a equipe de TV RBS, retransmissora da Globo no Sul, registrou a comercialização direta. "Quero R$15 mil nesse lote, e pode levar com casa e tudo", diz um agricultor. Outro sem-terra fala: "Tchê, por R$30 mil deixo tudo o que está dentro da casa".

MST diz que casos denunciados são minoria

"Além dos casos levantados no ano passado, no momento temos seis processos de reintegração em fase judicial aguardando decisão; 29 com a reintegração já concedida pela Justiça. Também há dois processos em fase administrativa e uma sindicância", informou em nota a superintendência do Incra no Rio Grande do Sul.

O MST no estado informou ontem que não apoia a venda de terras de assentamento. Segundo um dos coordenadores regionais do MST, Cedemir de Oliveira, há no Rio Grande do Sul mais de 14 mil famílias de sem-terra. Segundo ele, os casos denunciados são uma minoria "que não representa a força econômica e política do MST".

- Somos, inclusive, contra a titularidade dos assentamento. As áreas devem permanecer pertencendo ao Estado. O que está nas mãos de sem-terra não passa de concessão de uso - diz Oliveira.

Cerca de 20 sem-terra armaram barracas em frente ao prédio do Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, no início da noite de ontem. Eles protestam contra a ordem de despejo na região de Nova Santa Rita e reivindicam assentamento de duas mil famílias, como teria sido prometido pelo Incra daquele estado.

Há meses um conflito vem pondo em campos opostos procuradores da República e diretores do Incra. O problema começou após o órgão retirar da região de Nova Santa Rita arrendatários que plantavam arroz. O MPF acusou o superintendente do Incra do Rio Grande do Sul, Mozar Dietrich, de extorsão. As vítimas seriam plantadores de arroz. O procurador da República em Canoas, Adriano Raldi, enviou ação de improbidade pedindo o afastamento de Dietrich, que negou as acusações:

"Consideramos de extrema gravidade as acusações improcedentes que têm sido imputadas a este instituto, exatamente no momento em que se realiza um trabalho corajoso de combate ao arrendamento e a práticas ilegais em assentamentos de reforma agrária", informou o Incra em nota.