Título: Conta aberta nos Três Poderes
Autor: Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 06/05/2009, O País, p. 3

Câmara aprova, em votação final, divulgação diária, na internet, de gastos públicos.

Depois de driblar com um artifício jurídico o trancamento da pauta por medidas provisórias (MPs), a Câmara aprovou ontem projeto de lei complementar que amplia a transparência dos gastos públicos. A proposta obriga que União (incluindo os três Poderes), estados e municípios divulguem na internet, em tempo real, dados sobre seus orçamentos e gastos. A regra atinge todas as esferas de Poder ¿ Executivo, Legislativo e Judiciário. Pelo texto, que irá agora à sanção presidencial, haverá prazo de um a quatro anos para adaptação às novas regras.

O projeto altera a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), em vigor há nove anos. A lei já considerava ¿transparência da gestão fiscal a ampla divulgação da execução orçamentária¿, mas não era tão explícita quanto à liberação do conteúdo à população. O projeto original, apresentado em 2004, é de autoria do então senador João Paulo Capiberibe (PSB-AP).

Líderes aliados queriam trocar a expressão ¿em tempo real¿ para ¿no prazo de um mês¿ para a atualização, mas desistiram. Está mantida a regra de publicação diária dos gastos. Apesar de divergências sobre a eficácia da nova lei ¿ já que o governo federal dispõe de portais de transparência ¿, os partidos fizeram acordo e abriram mão de apresentar emendas. O Executivo Federal disponibiliza dados no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), mas o acesso é restrito a portadores de uma senha.

Pelo texto aprovado, a transparência será garantida por meio da ¿liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira em meios eletrônicos de acesso público¿. Outro item estabelece a adoção do Siafi, hoje restrito a técnicos do governo e parlamentares, pelos demais Poderes, e nos estados e municípios.

União e estados têm um ano para adesão

União, estados e municípios com mais de 100 mil habitantes terão prazo de um ano para divulgar as informações em tempo real. Já municípios entre 100 mil e 50 mil habitantes, prazo de dois anos; e cidades com menos de 50 mil habitantes, quatro anos a partir da publicação da nova lei.

¿ A proposta assegura acesso a todo tipo de informação. É um avanço concreto na transparência ¿ disse o vice-líder do governo, Beto Albuquerque (PSB-RS), que relatou a proposta em uma das comissões da Câmara.

Para o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), o projeto é importante e obriga até agências reguladoras a abrir os gastos.

¿ São acréscimos relevantes. O prazo foi muito longo, mas acho fundamental que o Brasil se incorpore ao rol de países em que o dirigente público se submeta a entrevistas coletivas periodicamente, que era a minha emenda. Com a lei de acesso (elaborada no Executivo), vamos poder acrescentar outros avanços de acesso aos documentos públicos.

Já o tucano Luiz Carlos Hauly (PR), autor de outras propostas sobre LRF, disse considerar o texto vago e duvidou que o governo vá sancionar a lei.

E lembrou que o governo já tem, além do Siafi, o Portal da Transparência, da Corregedoria Geral da União (CGU).

¿ A proposta não determina a meta, o que precisa ser publicado. Por que não abre o Siafi? O governo não quer nem abrir o Siafi para nada! Vou pagar para ver se o governo vai sancionar essa lei ¿ disse Hauly, lembrando que a área econômica nunca aceitou acabar com as senhas para o Siafi liberar o acesso aos dados.

Ainda que restrito, o acesso à execução financeira do Executivo Federal é possível, o que não acontece com o Judiciário ou Legislativo.

A proposta foi aprovada em tempo recorde depois que o presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), conseguiu apoio dos líderes para ignorar o trancamento da pauta por MPs ¿ o que espera aval do Supremo Tribunal Federal (STF).