Título: Indústria fraca, PIB em baixa
Autor: Beck, Martha; Alvarez, Regina
Fonte: O Globo, 06/05/2009, Economia, p. 19

Setor cresce 0,7% em março, mas acumula maior queda desde 90. Governo revê crescimento

Diante da lenta recuperação da produção industrial em março, a equipe econômica vai reduzir a projeção de crescimento da economia brasileira para 2009, que hoje está em 2%, antecipou ao GLOBO uma fonte do Ministério da Fazenda. Dados do IBGE divulgados ontem mostram que, apesar da alta de 0,7% no mês, a produção da indústria acumula, de outubro a março, perdas de 16,7% ¿ o maior recuo desde 1990, durante a recessão pós-Plano Collor.

Segundo técnicos do governo, a recuperação da indústria no mês ocorreu num ritmo inferior ao esperado.

Para que os 2% fossem mantidos, seria preciso que a produção tivesse crescido bem acima dos percentuais de janeiro (2,3%) e fevereiro (1,8%).

Mesmo revendo a projeção de crescimento do ano, a equipe econômica ainda acredita que o resultado final será positivo em função das medidas anticíclicas adotadas para enfrentar a crise, como mais de R$ 12 bilhões em desonerações e a redução do superávit primário. A tendência é que o número fique próximo do projetado pelo Banco Central (BC), de 1,2%. A nova previsão deverá constar do relatório de avaliação orçamentária do segundo bimestre, que será encaminhado ao Congresso até o dia 20, e pode implicar cortes adicionais no Orçamento. No fim de março, o governo anunciou corte de R$ 21,6 bilhões nas despesas de custeio e investimentos, mas editou decreto em seguida contingenciando R$ 25 bilhões.

A redução na expectativa de crescimento da economia pelo governo tem impacto na estimativa de receitas do Orçamento. Técnicos da área calculam que a receita bruta esperada para o ano cairá R$ 5,3 bilhões, se o governo reduzir de 2% para 1% a previsão de crescimento do PIB. Já se a nova previsão ficar em 1,5%, a queda de receita seria de R$ 2,65 bilhões.

Máquinas: recuo de 20,8% no trimestre

Na comparação com março do ano passado, a produção industrial recuou 10%, após queda de 16,8% em fevereiro.

É a quinta variação negativa consecutiva nessa base de comparação.

De janeiro a março deste ano, houve recuo de 14,7% ¿ o maior desde 1991. No entanto, para o coordenador da pesquisa do IBGE, Sílvio Sales, as expectativas para a indústria são boas. Ele ressalta que o Brasil vem apresentando altas na produção ante o mês anterior desde janeiro, deixando para trás as grandes quedas de novembro (7,1%) e dezembro (12,7%) e abrindo caminho para a retomada de um crescimento lento: ¿ Desde o início do ano, a indústria vem reagindo, mas de forma moderada.

Há uma reação mais intensa nos bens de consumo duráveis, impulsionados pela indústria de automóveis, o que não ocorre com bens de capital. As indústrias que são baseadas em exportação ainda estão sofrendo bastante, mas o mercado interno está respondendo às desonerações, o que é um bom sinal.

A única categoria industrial que apresentou queda na produção industrial de março foi a de bens de capital (6,3%). A atividade do setor despencou no trimestre: após 22 altas trimestrais consecutivas, registrou queda de 20,8%. As principais pressões negativas vieram de máquinas, aparelhos e materiais elétricos (15,3%) e equipamentos de transporte (-15,2%). Por outro lado, o movimento positivo na indústria foi liderado pelo setor de veículos, que, beneficiado pelo IPI, apresentou alta de 7%.

Também segundo especialistas, o avanço da produção industrial de 0,7% em março mostra sinais de uma recuperação, ainda que lenta e gradual, frente ao cenário de retração da economia mundial. Segundo Elson Telles, da consultoria Concórdia, a queda nas indústrias de bens de capital era esperada e deve continuar.

¿ A compra de máquinas e equipamentos é programada com antecedência e, por isso, o setor demorou a apresentar resultados negativos.

Mas a recuperação também acontecerá com defasagem ¿ disse o economista da Concórdia, que ainda projeta um PIB anual próximo de zero.

Segundo dados antecipados pelo vicepresidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, o faturamento do setor caiu 20% no primeiro trimestre, e os pedidos em carteira, 30%. Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infra-estrutura e Indústria de Base (Abdib), acredita que o quadro melhore no terceiro trimestre.

Segundo Marcela Prada, economista da Tendências Consultoria, a estimativa de 0,3% para o PIB deve se manter, mesmo após a queda divulgada ontem. Mas ela ressalta que, se ocorrer, a revisão será para baixo.

¿ Investimentos e projetos na indústria ainda estão sendo adiados, frente ao cenário de incerteza mundial ¿ afirmou, lembrando, no entanto, que o quadro de consumo interno está se recuperando. ¿ Para abril, esperamos alta de 1,5% na produção. A inflação está caindo, bem como os juros. E o acesso ao crédito melhorou.

Já o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) tem projeções otimistas em relação ao PIB. Segundo o coordenador de análises e projeções do instituto, Roberto Messenberg, a estimativa anual é de 1,5% a 2,5%.

Apesar da decisão de reduzir a projeção do crescimento, o governo mantém, publicamente, o discurso otimista.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem que a queda da produção industrial era esperada. Já o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, lembrou que o setor ainda apresenta dados ruins, mas está em recuperação continuada.

¿ A partir de março, a economia está se recuperando. Nós já voltamos a aquecer e acelerar. Já estamos em crescimento ¿ afirmou Mantega.

As vendas de automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus novos no país recuaram em abril, fazendo o setor acumular queda nos quatro primeiros meses do ano. As vendas caíram 13,64%, para 234.382 unidades, informou a Fenabrave.

¿ Já tínhamos dito que em março aquele volume enorme de veículos não era factível de ser mantido ao longo de 2009 ¿ disse o presidente da Fenabrave, Sérgio Reze.

COLABOROU Luciana Casemiro