Título: Brasil apoia egípcio polêmico contra brasileiros
Autor: Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 07/05/2009, O País, p. 8

Pelo menos Marcio Barbosa teria grande chance de dirigir Unesco, mas Itamaraty faz opção que contraria vários países

BRASÍLIA. Mesmo com dois brasileiros no páreo, o Brasil apoiará oficialmente o egípcio Farouk Hosni para o cargo de diretorgeral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Foram preteridos o diretor-adjunto da Unesco, Marcio Barbosa ¿ com grandes chances de ganhar a eleição, prevista para setembro ¿, e o senador Cristovam Buarque (PDT-DF).

A opção por Hosni foi confirmada ontem pelo Itamaraty, que, na avaliação de aliados do governo, estaria desagradando não apenas à comunidade científica nacional, mas a parceiros importantes, como EUA, Rússia, México, Argentina, França, Índia e China, que já teriam declarado apoio ao brasileiro Barbosa. Os EUA, recentemente, vetaram o nome do Hosni, devido a seu discurso antissemita. Os franceses, que antes haviam escolhido o egípcio, retiraram seu apoio.

¿ Sinto-me frustrado ¿ afirmou Barbosa ao GLOBO, por telefone, de Paris.

Barbosa ajudou a levar EUA de volta à Unesco Ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Barbosa conta com mais de 20 votos. Segundo funcionários do governo e parlamentares que acompanham sua trajetória, um de seus méritos foi levar de volta à Unesco, junto com o atual diretor-geral do organismo, o japonês Koichiro Matsuura, os EUA, afastados desde meados da década de 80.

Barbosa e Cristovam foram avisados da decisão pelo próprio chanceler Celso Amorim, semana passada. Um dos argumentos, relatou o senador, foi que o Brasil vem procurando manter boas relações com países árabes. O apoio a Hosni seria fundamental nessa estratégia.

¿ Minha candidatura só teria chance se contasse com o apoio direto do presidente Lula e do ministro Amorim. Mas o Márcio (Barbosa) fez uma grande campanha no mundo inteiro ¿ afirmou Cristovam.

Para o senador, a direção-geral da Unesco seria natural para o Brasil, graças a experiências como o Bolsa Família e a exploração de alternativas energéticas ¿ caso do etanol. O presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Eduardo Azeredo (PSDB-MG), criticou: ¿ Lamento o Itamaraty ter tomado essa decisão. Havia chances reais de o Brasil dirigir um órgão da importância da Unesco. O governo deveria apoiar um dos brasileiros.

Segundo fontes do governo, alguns fatores pesaram na decisão de apoiar Hosni, todos permeados pela necessidade de fortalecer relações com o mundo árabe. Entre eles, a maior participação do Brasil no processo de paz no Oriente Médio e o aval da região à candidatura do país a uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Amorim nega interesse em comando de agência nuclear Os mais inconformados dizem que a posição do país tem como foco a possibilidade de se ter um brasileiro, com apoio árabe, na diretoria-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Entre os cogitados estaria o próprio Amorim. O Itamaraty informou, ontem à noite, que apoia a candidatura do sul-africano Abdul Samad Mint para a AIEA .

¿ Não tenho interesse nesse cargo e, se o presidente Lula assim o quiser, gostaria de ficar no governo até o fim do mandato ¿ disse Celso Amorim.

Correntes do governo e do Congresso tentarão convencer Lula e o Itamaraty a pelo menos não apoiar Hosni. Segundo publicações internacionais, ele teria dito que queimaria os livros em hebraico que encontrasse, quando foi ministro da Cultura de seu país.

A decisão será levada a Paris até o dia 31 deste mês.

COLABOROU Demétrio Weber