Título: Turbulência financeira afeta metas da política industrial lançada há um ano
Autor: Paul, Gustavo; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 10/05/2009, Economia, p. 26

Queda no investimento e mudança de foco de empresários são principais entraves

BRASÍLIA. Prestes a completar um ano, a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), lançada em 12 de maio de 2008, acabou sendo atropelada pela crise financeira internacional e hoje é praticamente um apanhado de mudanças regulatórias que ainda não foram testadas nas fábricas. Essa situação põe em risco as metas para 2010 anunciadas no lançamento da PDP, como aumentar a participação brasileira no comércio exterior, ampliar os investimentos no país e elevar os desembolsos em pesquisa e desenvolvimento.

Idealizada em um cenário de franca expansão da economia, no primeiro semestre de 2008, a política industrial criou 86 medidas regulatórias distribuídas por quatro projetos de lei, 31 decretos, três resoluções da Câmara de Comércio Exterior (Camex) e quatro medidas provisórias que ainda tramitam no Congresso. Segundo o presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), Reginaldo Arcuri, essas medidas são essenciais para dar segurança jurídica a empresários: ¿ Não houve lançamento de medidas que depois não tivessem eficácia legal. Isso é o que interessa ao setor privado.

Entre as medidas, estão desde a suspensão da cobrança de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente em peças e materiais de embarcações até a redução do prazo para aproveitamento de crédito de PIS/Cofins. Outra ação reduz o percentual de empresas consideradas preponderantemente exportadoras, que caiu de 80% para 60%, aumentando o número de firmas beneficiadas pelos incentivos.

Demanda por produtos despencou com a crise O governo também modificou a regra da depreciação acelerada. Em vez de o empresário esperar até 36 meses para receber o imposto pago por uma máquina, poderá recuperálo em 12 meses, o que torna o investimento mais barato, pois paga menos imposto e gera capital de giro.

¿ A PDP está funcionando e estamos indo de acordo com o planejado ¿ defende Arcuri.

Mas algumas das ações chegaram com atraso, segundo empresários.

É o caso do chamado drawback integrado, que suspende o pagamento de PIS/Cofins e IPI para insumos adquiridos no país, desde que o produto final seja destinado à exportação ¿ aprovado recentemente.

Para o diretor do departamento de Competitividade e Tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), José Ricardo Roriz Coelho, todas as medidas legais adotadas são importantes, mas falta ainda implementálas. Além disso, a crise econômica mudou o foco dos empresários, que passaram a ficar mais interessados em obter crédito e capital de giro: ¿ Embora reconheça que a política industrial foi um grande passo, sua implementação enfrenta dificuldades para chegar até as empresas. Não temos exemplos de empresas que estejam usando (as mudanças legais).

Ainda há um desconhecimento muito grande entre os empresários.

Um dos principais pontos anunciados pelo governo é o aumento do volume de capital destinado às empresas pelo BNDES. Em razão da PDP, esse montante subiu de R$ 64,9 bilhões em 2007 para R$ 90,8 bilhões em 2008, e as taxas cobradas foram reduzidas.

¿ Esses são efeitos reais da política industrial ¿ diz Arcuri.

Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Carlos Velloso Dias, embora o BNDES tenha sido fundamental ao alargar o prazo de financiamento a juros mais baixos, não há demanda para esses produtos, por causa do forte desaquecimento da indústria em geral.

¿ A crise financeira atropelou a política industrial do governo.

Tudo o que foi feito acabou se perdendo. Nunca vi algo assim em 20 anos. Dinheiro para financiamento tem, mas vários setores, como o siderúrgico e o de mineração, não estão comprando nada ¿ diz.

O governo pretendia ampliar os investimentos para 21% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010. Com o aquecimento econômico de 2008, chegou a 20,4% no fim do terceiro trimestre, mas esse percentual caiu de lá para cá.

Por outro lado, a meta de as exportações brasileiras alcançarem 1,25% do comércio internacional foi atingida em função da queda das exportações mundiais.

Mas o objetivo de vender US$ 210 bilhões terá de esperar.

A meta oficial de vendas este ano foi revisada para US$ 160 bilhões, 20% menos do que em 2008.

¿ A PDP não é um programa, é uma política e tem uma amplitude muito maior.

Não dizemos que temos que comprar tantos tornos em tanto tempo. Dizemos que temos que aumentar o investimento em formação bruta de capital fixo em uma proporção maior do que o crescimento do PIB ¿ diz Arcuri, acrescentando que, sem a crise, provavelmente as metas teriam sido alcançadas.