Título: Síndrome de desconexão com a realidade
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 11/05/2009, O Mundo, p. 18

BUENOS AIRES. Na visão da analista política argentina Graciela Romer, ¿o resultado das eleições legislativas argentinas será decisivo para o futuro do projeto político de Néstor e Cristina Kirchner¿. Romer assegurou, ao GLOBO, que ¿a eleição de junho definirá o perfil dos candidatos que disputarão a Presidência em 2011¿. Pela primeira vez, disse, o casal K ¿enfrentará uma eleição num estado de fragilidade¿.

O GLOBO: Por que esta eleição é tão importante? GRACIELA ROMER: O governo enfrentará as eleições legislativas com um panorama local e internacional muito desfavorável, do ponto de vista político e econômico.

O impacto da crise econômica mundial é evidente e afeta os índices de emprego, pobreza. O governo enfrentará uma eleição num estado de fragilidade, econômica e política. Paralelamente, o peronismo está fragmentado, a liderança do presidente do partido (Kirchner) está em crise e a presidente não conseguiu superar a perda de popularidade sofrida com a crise dos produtores rurais (no ano passado). Uma derrota seria complicada.

Se Kirchner perder não terá chances de buscar uma reeleição? ROMER: Esta eleição definirá o perfil dos candidatos que disputarão a Presidência em 2011, no peronismo e na oposição. Por isso este resultado é tão importante para Kirchner e também para seus adversários.

O ex-presidente abandonou o poder com alta imagem positiva. Isso mudou? ROMER: Kirchner foi o presidente com mais alto nível de popularidade no final de sua gestão, mas a perda de apoio popular começou a ser sentida em 2007, sobretudo entre a classe média. Foi o setor mais prejudicado pelo aumento da inflação e muitas dessas pessoas não votaram em Cristina.

Mas a Casa Rosada acredita que a candidatura de Kirchner salvará o governo nesta eleição...

ROMER: Kirchner acredita nisso, não as pessoas que estão com ele. Esse é o grande problema. Vejo uma espécie de síndrome de desconexão com a realidade. Néstor acredita encarnar um projeto político que deve ser implementado apesar da existência de interesses ocultos que operam contra ele. Esses interesses podem ser representados pelos produtores rurais, pelo grupo Clarín, ou por outros. Essa é sua lógica de poder, uma lógica que deu certo durante um bom tempo. Estamos diante de uma sociedade que pede outro tipo de liderança. (J.F.)