Título: Moraes paga a dono de posto que tem contratos com sua mulher, a prefeita
Autor: Freire, Flávio
Fonte: O Globo, 13/05/2009, O País, p. 4

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS: Prestação de contas se repete com exatidão

Empresário aluga imóvel para secretarias do município por R$5 mil mensais

SANTA CRUZ DO SUL (RS). A verba indenizatória destinada ao deputado Sérgio Moraes (PTB-RS) parece sempre encontrar abrigo entre seus aliados, principalmente os que acompanham desde cedo a trajetória do político que diz se lixar para a opinião pública. Além de bancar com o dinheiro da Câmara o pagamento mensal de R$2,5 mil como aluguel de seu escritório político na cidade gaúcha de Santa Cruz do Sul - que funciona na casa onde fica o escritório de seu advogado, Marcos Borba -, Moraes também faz questão de todo mês gastar R$4,5 mil da verba indenizatória num mesmo posto de gasolina da cidade.

O posto é de Jefferson Tollotti, que explora os serviços de recolhimento de lixo e transporte público de Santa Cruz do Sul, administrada pela mulher de Moraes, Neiva Terezinha Marques, conhecida por Kelly.

"Tiro dinheiro do bolso e dou nota de R$4,5 mil"

A prestação de contas do deputado não tem alteração sequer de centavos, mesmo de um mês para o outro. Sempre com uma única nota do posto de Santa Cruz, Moraes justifica à Casa gasto exato mensal de R$4,5 mil em combustível. Ao saber que O GLOBO estava ontem na cidade, o deputado entrou em contato e explicou a curiosa precisão.

- Sempre gasto uns R$700, R$800 a mais do que a Casa permite (R$4,5 mil). Então, tiro dinheiro do próprio bolso e dou nota só de R$4,5 mil - disse, informando ter três carros.

Ele disse que usa sempre o mesmo posto porque fica no Centro da cidade e perto da casa de seu motorista. Já com o dono do posto, Jefferson Tollotti, a conversa não se estendeu.

- Quem é? - perguntou.

- É do jornal O GLOBO.

- Não estou ouvindo - devolveu o empresário, que não atendeu as ligações seguintes.

Recentemente, Tollotti assinou contrato para alugar um de seus imóveis a duas secretarias municipais. O prédio antes abrigava uma concessionária, que pagava aluguel de R$1,5 mil. A prefeitura vai desembolsar cerca de R$5 mil por mês.

Moraes disse ontem que estava pronto para mais uma "sacanagem da imprensa", principalmente quando indagado se já havia abastecido com a verba no posto que sua família mantém na zona rural da cidade.

- Não vou dizer se o posto é meu, vá na Receita e pergunte - disse, para em seguida explicar que o posto Tio Willy (apelido de seu pai) é de sua irmã, a ex-publicitária Marilene Moraes, 56 anos. Foi ela quem avisou ao deputado que repórteres do GLOBO estavam em frente à propriedade da família, onde se destaca uma mansão, em meio a uma área de bosques e aparentemente vigiada por seguranças.

- Não autorizo ninguém a fotografar a minha casa - disse, alegando que temia pela vida de sua mulher e filhos.

Moraes disse que, espontaneamente, deu explicações sobre o escritório político que funciona na casa de seu advogado:

- É só perguntar à imprensa local que eles vão dizer que sempre me entrevistaram lá.

Na sala onde o deputado atenderia a imprensa há uma mesa com a sigla BVK (Borba, Valentini e Konzen), sócios do escritório. A advogada Ana Paula Konzen disse que Moraes paga pelo aluguel, não por honorários. Perguntada se poderia apresentar os recibos ou o contrato, disse que a papelada estava com seus sócios, em Brasília.