Título: O governo manteve o pecado original da poupança
Autor: Casemiro, Luciana
Fonte: O Globo, 14/05/2009, Economia, p. 20

CORPO A CORPO : GUSTAVO LOYOLA

SÃO PAULO. Uma ¿meia-sola¿ tributária. Assim, o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola definiu as medidas anunciadas ontem pelo governo. Segundo ele, a equipe econômica cedeu à pressão política da oposição e optou por uma solução de curto prazo, que não corrige o ¿pecado original¿ da poupança: a manutenção de um piso alto para a taxa que remunera a aplicação. Além disso, não se mexeu na questão dos mutuários.

Aguinaldo Novo

O GLOBO: O governo acertou na mexida da caderneta? GUSTAVO LOYOLA: Anos de inflação galopante e planos heterodoxos deixaram marcas no sistema financeiro. O arcabouço da poupança é uma delas. Temos uma situação de um piso de juros nominais de 6,17% ao ano, quando tudo aponta para uma trajetória declinante das taxas básicas. Mas o governo acabou optando por uma solução parcial, uma meia-sola tributária. Não gostei. Todas as reformas são complicadas, porque mexem com o status quo. Mas alguém tem de fazê-las.

Onde está o erro? LOYOLA: O governo manteve o pecado original da poupança, do piso de remuneração. Em algum momento, a trajetória declinante dos juros vai bater nos 6,17% líquidos da poupança.

Mas havia espaço político para mudança mais ampla? LOYOLA: A discussão desse assunto deveria ter sido feita em bases técnicas, mas foi politizada pela oposição. Acuado, o governo adiou o problema, como tudo neste governo.

O que o governo, então, deveria ter feito? LOYOLA: Acho que a remuneração da poupança poderia seguir taxas flutuantes. Não colocaria a Selic como referência, porque a Selic vale para referenciar aplicações de um dia. Talvez a média dos CDBs. E também eliminaria a isenção fiscal, que sempre gera arbitragem por parte dos aplicadores. Se é para dar isenção, que se pense em estendê-la para os mutuários da casa própria. Aliás, será que ninguém pensou em reduzir os encargos dos mutuários atuais e futuros do SFH? O governo diz que protegeu os pequenos poupadores. Mas quem também vai proteger os pequenos mutuários?

Políticos de oposição e mesmo analistas disseram que o governo deveria pressionar pela redução das taxas de administração cobradas pelos bancos nos fundos de investimentos. Seria uma medida viável? LOYOLA: Obrigar como? Além disso, as taxas no Brasil refletem a estrutura de custos. Só no Brasil alguém pode aplicar apenas R$ 100 num fundo mútuo. O custo fixo é muito alto.