Título: CNJ: carro oficial é para uso restrito em serviço
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 17/05/2009, O País, p. 5

Tribunais e órgãos do Judiciário terão que controlar horário de uso e itinerário de cada veículo diariamente

BRASÍLIA. Carros oficiais não podem ser usados para passear, apenas para trabalhar. O que parece óbvio precisou ser alvo de resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) prevista para entrar em vigor nos próximos dias. De acordo com a regra, juízes de todo o país deverão estacionar esses veículos em uma garagem diariamente, ao fim do expediente, e em feriados e fins de semana. A medida foi criada para evitar abusos - como fazer viagens ou levar crianças para a escola.

Tribunais e órgãos do Judiciário deverão controlar o horário de uso e o itinerário de cada automóvel, todos os dias. Hoje não se sabe quantos veículos têm os tribunais. Até 31 de julho, cada órgão deverá enviar ao CNJ lista com todos os carros e os nomes dos juízes e funcionários beneficiados. O procedimento deve ser repetido todo ano.

A nova regra acaba com a farra de ocupantes de cargo de confiança terem direito ao privilégio. A resolução estabelece que no máximo dois funcionários por tribunal tenham carro oficial. Também determina que eventuais multas de trânsito sejam pagas pelos motoristas, e não pelos cofres públicos.

Outra novidade é proibir tribunais de comprar ou alugar carros de luxo para o uso dos juízes. "O porte, a potência e os itens de segurança e conforto dos veículos oficiais a serem adquiridos ou alugados serão condizentes com a categoria de uso a que se destinem, vedada a aquisição de carros de luxo", diz a resolução. A frota poderá ser trocada após, no mínimo, cinco anos de uso.

Essa regra específica encontrará a antipatia, pelo menos, da administração do Tribunal de Justiça do Piauí. Relatório elaborado após inspeção feita neste mês pela corregedoria do CNJ revela que, no tribunal, foram comprados recentemente "dois veículos Pajero Mitsubishi no valor unitário de R$118 mil e 14 veículos Honda New Civic no valor unitário de R$69,7 mil para atender sua demanda interna, totalizando aquisição de 16 veículos de representação, enquanto há séria carência de equipamentos, sistemas de informática e servidores necessitando de capacitação básica".

Segundo o documento, "por mais vantajoso que tenha sido o preço da aquisição, não é recomendável que se priorizem tais investimentos. O interesse público deve sempre se sobrepor ao individual, e os princípios da razoabilidade, moralidade e impessoalidade devem embasar as alocações dos recursos". O texto leva a assinatura do corregedor nacional de Justiça, ministro Gilson Dipp. Na semana passada, o CNJ abriu sindicância para apurar essas e outras irregularidades no tribunal do Piauí.

Críticos alegam que abusos não são regra

A nova resolução já está pronta, mas depende da aprovação do conselho para ser posta em prática. O presidente da Associação Nacional dos Magistrados (AMB), Mozart Valadares, elogiou a iniciativa. Recentemente, a AMB encaminhou ao conselho denúncia contra um desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco que teria usado carro oficial para ir à praia no fim de semana. O caso chegou a ser usado como exemplo pelos conselheiros, embora o tribunal o tenha negado.

- Carro oficial é um bem público e deve ser usado como tal. Em muitos estados, é utilizado como bem privado, em viagem de caráter pessoal e para levar crianças à escola - afirmou Valadares.

A falta de regra unificada deixa brecha para abusos. Hoje, cada tribunal regula o uso de seus veículos. A resolução já conquistou inimigos até no CNJ. No dia 17 de março, quando o conselho decidiu redigir a resolução, cinco dos 13 conselheiros presentes à votação discordaram, sob o argumento de que medida poderia infringir a autonomia dos tribunais.

- Regulamentar por meio de resolução significa que algo não está bem em todo o Brasil, o que não é verdade. O abuso se resolve por atuação disciplinar em casos pontuais - defendeu Rui Stoco no mesmo dia.

No entanto, o relator, conselheiro Antonio Umberto de Souza Junior, acabou conquistando a maioria do conselho.

- O Judiciário tem que dar o exemplo do zelo pela coisa pública - justificou.