Título: A vinculação entre desemprego e homicídio é mais direta com o tráfico
Autor: Almeida, Cássia
Fonte: O Globo, 17/05/2009, Economia, p. 26

Sociólogo afirma que violência doméstica também cresce com menos emprego

SOARES: "ARTES, esporte e religião diminuem a exposição à violência"

Sociólogo do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), Gláucio Soares, com sua larga experiência na análise da violência juvenil no Brasil, diz que os economistas são muito bem-vindos na análise das causas desse fenômeno no país. Para ele, o estudo de Roberta Guimarães, que relaciona crescimento do desemprego ao aumento de homicídios, dá um salto nessa relação entre violência e economia. Soares destaca drogas e álcool como agravantes do problema.

Cássia Almeida

Por que essa relação tão íntima entre desemprego e homicídio?

GLÁUCIO SOARES: A vinculação entre desemprego e homicídio é mais direta com o tráfico de drogas, porque isso dá mais dinheiro e também dá prestígio. O traficante é altamente respeitado. A criminalidade vinculada às drogas é uma carreira letal. A consolidação de um grupo se faz com a eliminação física do outro. A opção pelo tráfico se reflete na taxa de homicídios.

E em outros tipos de crime?

SOARES: Temos que separar os crimes de propriedade e os do tráfico, mas não temos dados que identifiquem bem o tipo de homicídio e a interação entre vítima e autor. A tese tem a virtude de buscar indicadores da população com mais risco.

Há outros crimes já estudados que aumentam com o desemprego?

SOARES: Sabemos que as mulheres morrem mais quando o desemprego aumenta. A violência doméstica cresce agravada ainda pelo consumo de álcool.

Quais as mudanças que ocorreram nos tipos de homicídios ao longo dos anos?

SOARES: O homicídio mais comum nas décadas de 40, 50 e 60 era o homem pobre matando o homem pobre numa birosca, primeiro com faca e depois com um .38. Esse tipo de homicídio foi substituído pela morte entre traficantes ou em virtude do consumo de drogas. E o item principal na composição é homem e jovem. Para cada dez homicídios na região metropolitana, sete estão vinculados à droga.

E o papel do álcool na violência?

SOARES: Gorbachev (Mikhail Gorbachev, último secretário geral do Partido Comunista da antiga União Soviética) fez restrições à bebida e, assim, caíram taxas de homicídio, suicídio e acidentes. Sai Gorbachev e entra Yeltsin (Boris Yeltsin), devoto do São Álcool. Voltam a crescer essas taxas, sem falar na cirrose hepática. O controle do álcool é parte integrante de várias políticas públicas de municípios colombianos. Colômbia, por exemplo, planta, refina e exporta, mas conseguiu reduzir a violência. Já Caracas, capital da Venezuela, que não tem toda a cadeia da droga, é seis vezes mais violenta que Bogotá.

Há exemplos como esse no Brasil?

SOARES: Em 2003, entrou em vigor o Estatuto do Desarmamento, e a taxa de homicídios cresceu mais devagar. Diadema, na Grande São Paulo, tem obtido grandes êxitos, a ponto de estar sendo estudada por especialistas de outros países. É um misto de ações sociais e controle do limite de consumo de bebida alcoólica.

A ociosidade conta muito, conforme o estudo...

SOARES: Há muitas atividades, além de estudar e trabalhar, que reduzem a exposição do jovem à violência. Religião, esporte, artes retiram o indivíduo do contexto de maior risco, impedem o encontro com um agente socializante do crime. Afinal, crime é aprendido.

Como o senhor vê essa entrada dos economistas na seara dos sociólogos?

SOARES: O estudo é um baita pulo adiante. O economista tem uma busca pela precisão. É importante a integração entre esses grupos. Por favor, economistas, sejam bem-vindos.