Título: A última a entrar na crise e a primeira a sair
Autor: Rodrigues, Luciana
Fonte: O Globo, 17/05/2009, Economia, p. 33

Relatório mostra recuo no emprego e no PIB na AL. Mas analistas dizem que região vai liderar expansão global no futuro

A crise internacional não poupou a América Latina. Indicadores reunidos pelo Grupo de Diários América (GDA), conglomerado que reúne 11 jornais de países da região, mostram que, desde o fim do ano passado, o desemprego subiu e a atividade econômica perdeu fôlego. O primeiro "Informe especial GDA: A crise na América Latina" - levantamento que será feito trimestralmente - trouxe previsões sombrias do mercado: as três maiores economias da região (Brasil, México e Argentina) vão sofrer uma recessão este ano. Mas, na visão de especialistas, a América Latina, que foi uma das últimas regiões a entrar na crise, será uma das primeiras a sair. E já há sinais de que isso pode estar próximo.

A recente alta nos preços das commodities (matérias-primas) e a melhora na atividade econômica da China trouxeram alívio para a região. Em abril, a cotação internacional da soja fechou em alta de 13,7% frente à média do último trimestre de 2008. O aumento do cobre foi de 13,5%. Na China, o pacote fiscal do governo começa a surtir efeito e já há previsões de que a economia vá crescer 7,5% este ano.

- Até o fim do ano passado, havia um descolamento, com os países emergentes crescendo apesar da recessão nos EUA e na Europa. Mas o agravamento da crise em setembro não poupou ninguém, porque houve uma súbita interrupção do crédito. Agora, já há indícios de um novo descolamento, muito associado à demanda da China, que levou a uma alta nas commodities, o que beneficia a América Latina - afirma Luiz Guilherme Schymura, diretor do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV).

Os exportadores são céticos em relação à melhora nos preços das commodities. Para José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), parte dessa alta é fruto de apostas de especuladores. Mas, no mercado, a visão é de que, mesmo diante de forte volatilidade, não há espaço para novas quedas nos preços de produtos básicos.

- As cotações já chegaram a um piso, não vão cair mais. Os preços não voltarão aos níveis recordes de meados de 2008, mas, frente às mínimas que alcançaram no fim do ano passado, deverão subir de 15% a 20%, especialmente em 2010, o que ajudará a América Latina - prevê Alfredo Coutiño, diretor para a região da Moody"s Economy.com.

Com gripe suína, PIB do México deve cair 5,5%

Coutiño destaca que, ao lado de China e Índia, a América Latina vai liderar o crescimento mundial na fase pós-crise. Em especial, diz o economista, Brasil, Chile e Peru, que poderão até registrar um crescimento negativo em 2009, mas cujas economias começarão a se recuperar já no segundo semestre deste ano. A América Central e o México, porém, demorarão mais tempo para sair da crise, devido ao forte vínculo dessas economias com os Estados Unidos.

Enquanto o México tem como ponto fraco a dependência dos EUA (destino de 80% de suas exportações), na América do Sul quem tem sofrido mais com a crise é a Venezuela, porque sua pauta é muito concentrada num só produto: o petróleo, que responde por 90% das receitas com vendas externas.

- São os dois casos extremos. O Brasil está na outra ponta, com uma pauta de exportações muito diversificada. A China, hoje nosso principal destino, não chega a comprar 25% de nossas exportações. E o complexo de soja, que lidera a lista dos produtos, tem só 5% da pauta - explica Luís Afonso Lima, presidente da Sobeet, entidade que reúne empresas transnacionais no Brasil.

Para Lima, a economia brasileira foi uma das menos afetadas graças também a um forte mercado doméstico. O Informe GDA mostra que, aqui, as exportações respondem por apenas 14% do PIB. No Chile, esse patamar é de 39% e na Costa Rica chega a 46%. Outro trunfo do Brasil é um sólido sistema bancário, acrescenta Lima: 79% do crédito do país vêm do setor financeiro nacional.

Antonio Corrêa de Lacerda, professor da PUC-SP, acrescenta que o Brasil tem bancos públicos de relevância. O BNDES vai desembolsar US$50 bilhões este ano, mais de quatro vezes o volume de empréstimos previstos pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para toda a América Latina (US$12 bilhões).

Se o Brasil é o país mais blindado, o México é o mais exposto à crise. Os indicadores GDA apontam uma previsão de queda de 4% no PIB do país este ano. Coutiño, da Moody"s é mais pessimista. Ele antes previa um recuo de 4,5% do PIB. Com a gripe suína, que afetará o turismo e as exportações agrícolas do país, sua estimativa agora é de queda de 5,5% do PIB. Coutiño lembra que 65% das receitas de turismo do México vêm de visitantes americanos.