Título: Ministra deveria sair de licença
Autor: Camarotti, Gerson; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 20/05/2009, O País, p. 10

Saiu o Programa de Aceleração do Crescimento como principal item da agenda da ministra Dilma Rousseff, da Casa Civil, candidata à sucessão de Lula.

No lugar, e contra a vontade de Dilma, entrou sua saúde.

Foi isso o que ocorreu quando, em 25 de abril, Dilma admitiu que estava doente. O episódio de ontem só serviu para consolidar o que ocorrera.

Resta saber se Dilma, Lula e todos que os cercam ainda insistirão com a história de que pouco mudará na vida da ministra depois da descoberta de que ela sofre de câncer linfático.

É canhestra e perigosa a tentativa de fazer Dilma se comportar como se nada de grave tivesse lhe acontecido. Infelizmente, aconteceu.

Disseram que ela não tem mais câncer desde o momento em que os médicos extraíram um nódulo alojado debaixo da axila do seu braço esquerdo.

Nada mais falso.

O nódulo, em casos de câncer linfático e em linguagem de leigo, é uma manifestação da doença. Não basta eliminá-lo para que o doente possa ser considerado curado.

Como o sistema sanguíneo, o linfático faz parte do sistema circulatório. Desempenha papel importante nas defesas do corpo contra a infecção e alguns outros tipos de doença, inclusive o câncer.

Disseram que Dilma seria submetida a sessões de quimioterapia (em princípio, seis) só por cautela. Para evitar, por exemplo, a volta da doença.

Nada mais falso.

A quimioterapia, combinada com a ingestão de remédios, é vital para, digamos, matar a doença.

O câncer de Dilma foi detectado logo no início. As chances de ela se curar, de fato, são de 90%, como informaram os médicos.

Mas não é recomendável a ninguém que sofra de câncer manter inalterada sua rotina de vida. Muito menos quando a rotina é estressante, pesada, exaustiva.

Até ontem, a ambição política de Dilma, alimentada por Lula, ditou todos os seus passos.

Qualquer coisa que tenha obrigado Dilma a voar às pressas de Brasília a São Paulo deveria funcionar como um sinal de que chegou a hora de ela pensar unicamente na preservação da própria vida.

Dilma deve pedir licença do cargo para se cuidar melhor, e a salvo dos holofotes da mídia. É o que a prudência e o recato recomendam. É também o que recomenda o próprio cálculo político.

Nada será mais devastador para a candidatura dela do que o exame diário de cada um de seus gestos à luz de seu estado de saúde. E é inevitável que seja assim quando uma figura pública padece em praça pública.

Se o tratamento for bem-sucedido, como tudo sugere que poderá ser, Dilma terá tempo bastante para se dedicar novamente ao governo e à sua candidatura.

Ricardo Noblat tem um blog no site do GLOBO e é colunista do jornal