Título: Uma fila que começa a andar
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 01/06/2009, Economia, p. 15

Por questões políticas, Congresso e governo agilizam tramitação de projetos para destravar economia

Gustavo Paul

Após ficar praticamente parada em 2008, a tramitação de projetos importantes para destravar a economia recomeçou a andar no Congresso nas últimas semanas. Fruto da articulação entre a presidência da Câmara e o Palácio do Planalto, o ressurgimento da "agenda microeconômica" tem razões políticas que extrapolam seus benefícios à economia. O presidente da Câmara, Michel Temer, quer votar os projetos para recuperar a imagem do Parlamento, fragilizada por denúncias de uso indevido de verbas públicas. Já o Executivo procura sinalizar que a atividade econômica pode ganhar mais fôlego apesar da crise.

O exemplo mais claro dessa movimentação foi a votação, em maio, do projeto que cria o Cadastro Positivo, um banco de dados sobre bons pagadores, que poderá levar à redução dos juros e do spread bancário. O projeto, encaminhado em 2003 pelo deputado Bernardo Ariston (PMDB-RJ), ganhou envergadura em 2005, quando o Executivo enviou proposta semelhante ao Parlamento. O texto, que por cinco meses amargou a fila de espera da votação, agora começa a tramitar no Senado.

Formada por projetos de lei que aperfeiçoam várias áreas, essa agenda é considerada estratégica para azeitar o ambiente de negócios e dar sustentação ao crescimento. Em plena crise, analistas apontam que são uma alternativa eficaz para modernizar a economia, sobretudo porque reformas estruturais importantes, como a trabalhista e a previdenciária, dificilmente sairão do papel neste governo.

Lançada de maneira informal no apagar das luzes de 2004, na gestão do ex-ministro Antonio Palocci, por meio de um extenso documento do Ministério da Fazenda, a agenda micro já teve projetos importantes aprovados, como a Lei de Falências. Outros foram agregados ao longo dos anos.

De nove projetos, só um foi aprovado

Levantamento feito pelo GLOBO mostra que, dos nove importantes projetos existentes em janeiro de 2008, só um foi aprovado - a Lei do Gás, que disciplina o setor -, ainda assim no esforço legislativo do fim do ano passado. Os demais ainda tramitam, incluindo a Reforma Tributária.

O próximo projeto que deve ser votado pelos deputados é o que estabelece as prerrogativas federal, estadual e municipal para determinar licenças ambientais. Com prerrogativas que se misturam, esse é um dos principais gargalos às obras de infraestrutura. O projeto, incluído como um dos destaques no lançamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em janeiro de 2007, pode ser uma solução para simplificar a concessão de licenças ambientais. A licença para a hidrelétrica de Jirau, por exemplo, depende da anuência do Ibama, do governo de Rondônia e da prefeitura de Porto Velho. O projeto, que já esteve para ser votado duas vezes na última quinzena, pode ser incluído na pauta de amanhã.

Outra que pode desencantar, após quatro anos, é a Lei Geral das Agências Reguladoras, que colocaria um ponto final na polêmica em torno dos direitos e deveres dos órgãos reguladores, o que pode reduzir a insegurança regulatória no país. Parado desde 2008, o projeto mudou de relator: sai o ex-deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ) e entra o líder do governo, Ricardo Barros (PP-PR).

- Há mais espaço para a votação dessas matérias. A agenda encontrou um ambiente favorável - diz Barros.

Curiosamente, o ambiente favorável surgiu do mau momento no Parlamento. Segundo o cientista político Murillo de Aragão, da consultoria Arko Advice, Temer decidiu imprimir ritmo às votações para mostrar resultados à sociedade. A medida mais contundente foi a releitura do princípio de que as medidas provisórias com prazo de tramitação vencido não impedem votações em sessões extraordinárias, apenas nas ordinárias. Com isso, os projetos começaram a ser apreciados.

- A pauta de aprovações de projetos é extraordinária perto do que era no passado - diz Aragão.

Para o cientista político Antonio Augusto Lopes, analista do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), governo e Parlamento trabalham juntos.

- O objetivo de Michel Temer é apresentar projetos aprovados em 2010. Caso contrário, vai parecer que a instituição é desnecessária.

Alguns projetos venceram o tapete verde da Câmara e entraram no azul, do Senado. É o caso do texto que reformula o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, fortalecendo o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e tornando mais ágil o julgamento de fusões.