Título: Problema do ensino é assustador, diz educador
Autor:
Fonte: O Globo, 29/05/2009, O País, p. 12

Especialistas aprovam pacote para docentes, mas dizem que é preciso melhorar mais o salário e a qualidade de cursos

SÃO PAULO, RIO e BRASÍLIA. Embora o Ministério da Educação (MEC) tenha anunciado que 382 mil professores não possuem formação adequada para lecionar, o número de docentes desqualificados nas escolas brasileiras pode ser muito maior. A opinião é de Jacques Therrien, professor da Universidade Federal do Ceará (UFCE) e pesquisador em educação.

- Desde a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), em 1996, houve uma corrida de professores para cursos de pedagogia de fundo de quintal, que garantem diploma formal e aumento salarial, mas não ensinam. O buraco pode ser maior- disse Therrien.

Para o pesquisador, ainda há muitas dúvidas em torno do significado dos números apresentados anteontem pelo MEC:

- Precisamos saber o que significa isso. É um número assustador que se refere a um problema assustador.

Segundo ele, a prova para avaliação dos professores por si só não surtirá efeito. Entre as medidas anunciadas, a mais promissora é a abertura de 330 mil vagas de licenciatura:

- Não adianta nada fazer teste de conhecimentos com professores. Tem que ver se existe condição de trabalho, tempo para estudar, material adequado. É um desafio para todas as universidades cobradas a participar. Jogar mais 100 alunos em cada sala, além de não resolver, atrapalha os que já estavam lá. Tem que vir acompanhado de investimento.

"A licenciatura não está na agenda das universidades"

Para o educador Mozart Neves Ramos, diretor do movimento Todos pela Educação, é preciso atrair para o magistério os melhores alunos do ensino médio, diferentemente do que ocorre hoje, em que boa parte das vagas é preenchida por quem não consegue aprovação em cursos mais disputados.

- Enquanto a gente não atrair os melhores, não vai ter jeito. Os melhores vão para a medicina e cursos mais valorizados. A licenciatura não está na agenda das universidades. Pode ser que entre - afirma, citando países como Finlândia e Coreia, em que os melhores alunos seguem a licenciatura, que oferece bons salários.

É preciso ainda, diz ele, qualificar os cursos de licenciatura:

- São cursos noturnos, ministrados por professores substitutos, mestrandos sem prática pedagógica. Daí saem os futuros professores.

Mozart é professor de licenciatura na UFPE. Leciona uma disciplina específica de Química criada devido ao baixo nível de conhecimento dos calouros:

- Os alunos têm graves deficiências. É preciso tratá-los de forma acolhedora. Mas nenhum dos meus colegas com doutorado quer essa aula.

Já o professor da Uerj e titular da pós-graduação em Educação da UniRio Luiz Carlos Gil Esteves elogiou a iniciativa do MEC.

- É preciso ter um ponto de partida. A primeira coisa é saber o tamanho do buraco e, a partir disso, tomar medidas.

Esteves discorda da tese de que o piso salarial de R$950 é muito baixo para atrair os profissionais mais qualificados.

- Nas grandes cidades pode ser pouco, mas, em cidades do interior, é atraente.