Título: Ninguém segura esse dólar
Autor: Frisch, Felipe; Rodrigues, Eduardo
Fonte: O Globo, 30/05/2009, Economia, p. 27

Moeda fecha a R$1,97, pela 1ª vez abaixo de R$2 desde outubro. Queda no ano é de 15%

Eo dólar comercial, enfim, ficou abaixo de R$2. A moeda americana encerrou os negócios ontem a R$1,97, com perda de 1,94%, uma desvalorização forte até para os últimos dias, depois de chegar a bater R$1,967 durante a tarde. Assim, a divisa completou um ciclo de seis dias consecutivos de queda, que, acumulada, é de 3,29% desde o dia 22. Um dos motivos para a queda recente do dólar é a entrada de dólares no país, para investimento em ações e em operações atreladas à taxa básica de juros, a Selic, hoje em 10,25% ao ano, como os títulos públicos. Somente em maio, até o dia 26, o saldo (compras menos vendas) de investimentos estrangeiros na na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) está positivo em R$5,059 bilhões. No ano, a conta já chega a R$10,176 bilhões.

No ano, o dólar já acumula perda de 15,59%, mas a perda foi bastante concentrada em maio, quando a moeda caiu 9,67%, tendo saído de R$2,181. No fim do ano, ainda era cotada a R$2,334. A cotação de ontem é a mais baixa desde o início de outubro, que deve ser mais difícil de ser alcançada: R$1,925. No turismo, a moeda foi vendida ontem no Banco do Brasil a R$2,04. No Bradesco, a R$2,09.

Mas o movimento de desvalorização da moeda americana não é uma exclusividade brasileira. A divisa está caindo no mundo todo. Contra o dólar canadense, por exemplo, o dólar americano já caiu 10,20%. Em relação à libra inglesa, a perda é de 9,77%. Na comparação com o franco suíço, o dólar ainda se valoriza no ano. No entanto, a divisa americana já caiu 10,54% em relação à moeda suíça desde março. E é frente ao real que o dólar mais perde valor entre as principais moedas do mundo.

- Não há um motivo só para a queda do dólar. Mas são muitas explicações possíveis, entre elas o ingresso maior de recursos - diz Mario Battistel, gerente de câmbio da Fair, lembrando ainda que ontem, último dia útil do mês, era data de formação da Ptax, taxa fixada pelo Banco Central (BC), que baliza os contratos de câmbio negociados na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), motivo para a queda mais acentuada no dia.

Nessas operações, há investidores que apostam na alta da moeda americana e os que apostam na baixa. Os estrangeiros estão na ponta da venda, ou seja, apostavam na queda do dólar. Outro evento no mercado futuro que tem pressionado a queda da divisa é o vencimento, na segunda-feira, dos chamados swaps reversos, operações em que o Banco Central (BC) acerta a compra do dólar a uma cotação, no caso em torno de R$2,14, e paga juros aos bancos que aderiram à operação. Estas instituições estariam forçando a queda do dólar, para ganhar a diferença entre a cotação que o o BC pagará e a do mercado.

Juros altos atraem investidores

Apesar do esforço do BC, que vem comprando diariamente dólares para tentar suavizar a desvalorização, especialistas observam que o poder da autoridade monetária é pequeno diante do tamanho do capital internacional. O Banco Central adquiriu no mercado à vista US$2,408 bilhões este mês até o dia 22, mas não conseguiu conter a queda livre. Segundo o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, o capital externo, diante da frustração com a economia americana - antes considerada inabalável - encontra no Brasil um local estável para ser alocado.

- A desvalorização do dólar ocorre do mundo porque os investidores têm migrado para outros países. Como a mobilidade do capital hoje em dia é alta, quando o agentes se decepcionam, a reação é rápida. Mas, para reconquistar a confiança, é um processo bem mais lento e difícil - diz.

O professor de derivativos e risco do Insper (ex-Ibmec-SP), Alexandre Chaia, aponta a recuperação dos preços da commodities (matérias-primas negociadas em bolsas mundiais) como outro fator que derruba o valor da moeda americana, por meio de um mecanismo natural de equilíbrio das contas globais:

- A variação em relação ao real acaba potencializada pela atratividade do nosso mercado financeiro, em grande parte devido aos altos juros que ainda são aqui praticados.