Título: OEA pressiona EUA para ter Cuba de volta
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Fonte: O Globo, 03/06/2009, O Mundo, p. 31

Criticada por demais países ao impor condições a Havana, Hillary Clinton aceita negociar, mas impasse permanece

Apressão para o retorno de Cuba à Organização dos Estados Americanos (OEA) isolou o governo americano ontem, no primeiro dia da reunião de chanceleres da entidade, em Honduras. Após a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, ter sido muito criticada por ter imposto condições à volta de Cuba à OEA, Washington decidiu sentar à mesa de negociação, mas não foi atingido um acordo.

A 39ª Assembleia Geral da OEA tem a violência como tema oficial, mas Cuba dominou a discussão na primeira sessão, ontem, na cidade de San Pedro Sula. Os discursos duros dos presidentes de Honduras, o anfitrião Manuel Zelaya, Paraguai, Fernando Lugo, e Nicarágua, Daniel Ortega, deram o tom. Isso fez o secretário-geral da entidade, José Insulza, buscar uma solução de consenso.

- Houve aproximações formais entre as delegações - afirmou Insulza.

No fim da tarde, seguindo uma proposta brasileira, um grupo de dez integrantes foi formado, com representantes de Brasil, EUA, Canadá, Argentina, Venezuela, Belize, Jamaica, Nicarágua, México e Honduras.

- Eu não sei se teremos uma solução, mas certamente temos que tentar - afirmou o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim.

No início da noite, porém, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton - que embarca hoje para o Egito - deixou a reunião e afirmou que não havia um consenso.

- Neste momento não há consenso nem há um acordo sobre a ação que se deve seguir - disse ela. - O que vai acontecer agora não está claro.

Restava a possibilidade de um voto, que provavelmente dividiria a OEA.

Horas antes da reunião, durante um café na manhã com chanceleres caribenhos, Hillary confirmara o que vinha dizendo nos últimos dias: para os EUA aceitarem a volta de Cuba à OEA, ela advertiu que é preciso que o regime dê passos na direção da democracia.

- Esperamos a chegada do dia em que Cuba possa voltar à OEA, mas acreditamos que a integração à OEA deve vir com responsabilidades - disse ela. - Estou convencida que chegaremos a um caminho comum para avançar.

No jornal estatal cubano "Granma", Fidel Castro desmereceu as críticas americanas a seu governo:

"Qual é a "democracia" e os "direitos humanos" que os Estados Unidos defendem? Era realmente necessário lançar essa humilhante e prepotente advertência?"

Consenso difícil em grupo de trabalho

As declarações de Hillary foram mal recebidas. Os ataques à postura americana começaram logo no discurso inicial, do hondurenho Zelaya:

- É necessário reparar o erro de 1962 - disse o anfitrião da reunião, referindo-se ao ano em que Cuba foi expulsa da OEA, depois de Fidel Castro formalizar a adoção do comunismo por seu regime. - Não devemos sair desta assembleia sem reparar a infâmia contra um povo.

O nicaraguense Ortega acusou os EUA de serem os responsáveis pela situação, pois, segundo ele, a votação que expulsou Havana da OEA foi feita por "países com tiranias e ditaduras que eram instrumentos de dominação da política imperialista dos EUA":

O paraguaio Fernando Lugo, menos estridente do que Ortega, apelou para um debate que chegue à conclusão de que é preciso uma "América unida, sem discriminação".

O Brasil acabou, mais uma vez, funcionando como uma ponte entre os mais radicais países sul-americanos e os EUA. Sob o argumento de que o tema de Cuba é um "cadáver insepulto", Celso Amorim propôs a criação do grupo de trabalho. Segundo um graduado diplomata brasileiro, a ideia é que a entrada dos cubanos não seja automática, como querem venezuelanos e outros, mas também não passe a ser condicionada a procedimentos relacionados à democracia e aos direitos humanos, por exemplo, sem a concordância de Havana.

- Nossa posição é intermediária. É preciso um consenso entre os países-membros da OEA. A entrada de Cuba passou a ser considerado um caminho sem volta - disse esse diplomata.

COLABOROU Eliane Oliveira