Título: Cargos de afilhados crescem mais
Autor: Alvarez, Regina
Fonte: O Globo, 07/06/2009, O País, p. 3

Profissionais sem vínculo com o serviço público aumentaram 27,3% no governo Lula

Regina Alvarez

Odiscurso de que é preciso reforçar a máquina pública com funcionários de carreira, usado pelo governo para justificar o aumento do quadro e das despesas com pessoal, não se aplica no preenchimento dos cargos de confiança. O número de profissionais sem vínculo com o serviço público com DAS (cargos de Direção e Assessoramento Superior) cresceu 27,3% na atual gestão, passando de 4.250 para 5.411. É bem mais que o crescimento total desses cargos, que passaram de 18.632 em 2002 para 20.616 em 2009, um aumento de 10,6%.

No mesmo período, o número de servidores públicos federais efetivos ocupantes de cargos de confiança cresceu 8,8%. Os concursados eram, em 2002, 12.371 ocupantes de DAS, e passaram para 13.465 em 2009, segundo registros do Boletim Estatístico de Pessoal, editado mensalmente pelo Ministério do Planejamento.

A estatística mostra também que o número de profissionais sem vínculo com o setor público cresceu mais nos cargos mais altos (DAS 3, 4, 5 e 6), cujos salários variam de R$4,5 mil a 8,6 mil. Em sete anos, o número de ocupantes de DAS-3 pulou de 580 para 948, um aumento de 63,4%. Os ocupantes de DAS-4 sem vínculo passaram de 652 para 960, aumento de 47,2%. São cargos destinados a coordenadores de áreas nos ministérios. Já os ocupantes de DAS-5 (assessores especiais de ministros, chefes de gabinete) passaram de 240 para 331, aumento de R$37,9%. No caso dos DAS-6 (secretários e dirigentes de autarquias), o número de ocupantes sem vínculo passou de 60 para 89, crescimento de 48,3%.

O secretário de Gestão do Ministério do Planejamento, Marcelo Vianna, não vê no preenchimento de cargos de confiança com pessoas de fora do serviço público qualquer contradição em relação à política do governo Lula para o funcionalismo. Na sua visão, o fato de não pertencerem ao setor público não desqualifica os ocupantes desses cargos.

- O cargo é de livre provimento. Nem todo mundo que vem de fora vem para se pendurar num cabide. Tem gente que chega e faz um trabalho excelente, e tem também funcionário público que não quer nada com a hora do Brasil - afirma.

Estudo recente sobre o perfil dos ocupantes de cargos da alta administração no governo Lula - apresentado pela pesquisadora Camila Lameirão, da Fundação Getulio Vargas, no 2º Congresso do Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração (Consad), em Brasília - identificou um forte engajamento social, político e sindical nesses profissionais. Viana também defende isso:

- É normal que a direção estratégica do governo tenha pessoas vinculadas ao programa político-partidário da coligação que ganhou a eleição - defende.

Boa parte é ligada a partidos e sindicatos

Baseado em uma amostra dos ocupantes de DAS 5 e 6 e de cargos de Natureza Especial (NE), o estudo mostra que 25,9% desses profissionais são filiados a partidos políticos, sendo que 80% deles declararam ser do PT. No primeiro mandato, os filiados eram 24,8%. A pesquisa mostra também que há um grande contingente de profissionais com filiação sindical - 45% no primeiro mandato e 42,8% no segundo.

A participação desses profissionais em movimentos sociais também é elevada. No primeiro e no segundo mandato, 46% dos pesquisados se declaram militantes desses movimentos. A amostra englobou 302 ocupantes de cargos de confiança no primeiro mandato e 417 no segundo.

"São diferentes formas de engajamento cívico que, no cômputo geral, fazem desses dirigentes pessoas com forte interface com partidos, sindicatos e organizações da sociedade civil se comparada com a sociedade brasileira em geral. Esta interface deve nos remeter a preocupações teóricas importantes na questão das relações entre Estado e sociedade", afirma o estudo.

A seguir, expõe as preocupações sobre esse modelo de ocupação dos cargos: "De que forma esse tipo de participação no governo aumenta de fato a presença das demandas da sociedade frente ao Estado? Ou se, ao contrário, esta presença pode representar uma captura da sociedade por representantes junto às esferas estatais, instrumentalizando interesses e necessidades desses grupos em troca de benefícios eleitorais ou de permanência no poder".

A pesquisa mostra que a escolaridade dos integrantes das amostras do primeiro e do segundo governo Lula apresenta semelhanças. "Em torno de 95% de cada amostra é composta por pessoas com nível superior ou pós-graduação. Cerca de 16% possuem como título máximo o terceiro grau, cerca de 30% cursaram alguma especialização e 50% fizeram mestrado ou mestrado e doutorado", revela o estudo.

No segundo governo houve um ligeiro aumento de ocupantes dos cargos da alta administração com escolaridade até o nível médio: eram cinco no primeiro mandato e passaram para 11 agora.

Nas conclusões do seu estudo, Camila Lameirão afirma que o preenchimento desses cargos se faz recorrendo a lógicas que vão desde competência e confiança até padrões clientelistas: "Como são cargos importantes para o desempenho da máquina pública, assumem papel crucial no sistema decisório. De outra parte, são formas de prestigiar alianças partidárias e sindicais, no caso dos dois governos Lula".