Título: Atos secretos podem passar de 500
Autor: Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 12/06/2009, O País, p. 3

Cúpula do Senado quer cautela na divulgação de medidas

Dados preliminares que já estão em poder de integrantes da Mesa Diretora do Senado indicam a existência de mais de 500 atos secretos que não foram publicados no Boletim Administrativo da instituição. Numa primeira fase, a comissão instalada para analisar esses atos identificou cerca de 300 atos. Entretanto, no comando do Senado, a constatação é que o escândalo deve ser muito maior.

O relatório final da comissão que seria apresentado hoje foi adiado para a próxima semana. Em outra frente, o Ministério Público pedirá ao Tribunal de Contas da União (TCU) a anulação de todos os atos e a devolução do dinheiro que teria sido pago indevidamente.

A cúpula do Senado decidiu adotar a cautela para definir como será feita a divulgação dos atos. A Mesa Diretora avalia como seria feita uma eventual anulação dessas decisões, que foram tomadas sem divulgação, como determina a lei. Os atos secretos foram usados para nomear parentes, amigos, criar cargos, aumentar salários e até mesmo liberar hora extra sem limite para os servidores.

- A publicidade de decisões públicas é um dever constitucional. Por isso, é preciso que haja a devolução de recursos aos cofres públicos de decisões tomadas em atos secretos - cobrou o líder do DEM, senador José Agripino Maia.

Os atos secretos foram instituídos pelo ex-diretor geral do Senado, Agaciel Maia, e utilizados nos últimos dez anos por todos os ex-presidentes da instituição. Ontem, o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), informou que deve pedir a demissão de Agaciel dos quadros do Senado por improbidade administrativa. Ele já pediu as notas taquigráficas da audiência em que o ex-diretor do Senado teria negado a existência de atos secretos, no último dia 2. Na quarta-feira, Virgílio afirmou no plenário que Agaciel teria mentido sobre o tema ao ser questionado por integrantes da Mesa Diretora.

O ex-diretor foi ouvido por causa da acusação feita pelo ex-diretor de Recursos Humanos da Casa, João Carlos Zoghbi, e sua mulher Denise, de ser "dono do Senado" e de manter um esquema de propina com terceirizadas que atuam no Senado. Sem apresentar provas, o casal afirmou que Agaciel dividia com senadores que ocuparam cargos de 1º secretário da Casa os lucros obtidos irregularmente e de que o ex-diretor utilizaria o nome de irmãos para que empresas suas fossem subcontratadas por prestadoras de serviço do Senado. Mas depois, eles recuaram das denúncias.

- Perguntei textualmente ao Agaciel se havia atos secretos nesta Casa. Ele respondeu que não. Eu quero saber que valor tem aquele depoimento. O que significa ele ter dito que não havia atos secretos e, de repente, eles surgem. Já pedi as notas taquigráficas para entrar com um processo administrativo por ele ter mentido aos senadores - disse Virgílio.

Horas extras e diárias a mais

O procurador Marinus Marsico, que representa o Ministério Público junto ao TCU, afirmou que os atos secretos não têm validade jurídica e devem ser declarados nulos. Ele pretende avaliar cada caso para estudar a possibilidade de cobrar a devolução do dinheiro pago indevidamente pelo Senado:

- Todo ato só passa a valer depois de ser publicado. Isso é uma regra básica da administração pública. O princípio da publicidade está previsto na Constituição, assim como os da legalidade e da moralidade. A assinatura de atos secretos pode gerar um precedente muito perigoso.

Ainda de acordo com o procurador, o escândalo também pode dar origem a ações de improbidade administrativa contra os envolvidos na distribuição de benesses com base nos atos secretos:

- Todos sabem que os atos da administração pública têm que ser públicos. Nesse caso, é difícil acreditar na boa-fé dos responsáveis.

Os atos secretos foram usados para ampliar o pagamento de horas extras a servidores do Senado, segundo reportagem publicada ontem no "Estado de S.Paulo". Segundo o jornal, o benefício foi concedido a cerca de 800 servidores. Outro ato teria permitido que os servidores em viagem ao exterior recebessem diárias além dos dias estipulados.