Título: É injustiça do país me julgar
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 17/06/2009, O País, p. 3

Sarney se defende, diz que "crise é do Senado" e não dele, mas não anula atos secretos

Sem novas medidas de impacto para responder à crise enfrentada pelo Senado, o presidente José Sarney (PMDB-AP) recorreu ontem à própria biografia para se defender das acusações de que teria sido um dos beneficiados pelos mais de 500 atos administrativos secretos adotados pela Casa nos últimos anos - que ajudaram a omitir a exoneração de um de seus netos, além da contratação de duas sobrinhas, uma ex-nora, amigos e correligionários.

Da tribuna, Sarney declarou que "é injustiça do país julgar um homem com tantos anos de vida pública". E, num recado aos colegas, avisou que não assumirá sozinho a responsabilidade por atos da Mesa Diretora aprovados em plenário. Embora considerando que o discurso não fora suficiente, a maioria dos colegas poupou Sarney de críticas.

- A crise do Senado não é minha. A crise é do Senado, e é esta instituição que nós devemos preservar - disse, logo no início de seu discurso. - Todos somos responsáveis. Nós aprovamos aqui os atos da Mesa. O Senado no seu conjunto aprovou os atos da Mesa. Temos que corrigir o que está errado. E estarei pronto para cumprir tudo o que o Senado decidir. Vou levar em frente, doa a quem doer.

Diante de uma platéia em silêncio, Sarney falou por 33 minutos, sem permitir apartes. Mas não anunciou o afastamento do diretor-geral, Alexandre Gazineo, embora nos bastidores se garanta que o nome de seu sucessor esteja escolhido: Doris Marize Romariz Peixoto, funcionária de carreira que foi chefe de gabinete de sua filha e atual governadora do Maranhão, Roseana Sarney. Tampouco propôs a anulação dos atos secretos, que só agora começaram a ser publicados. Sarney se limitou a ressaltar que esses atos não teriam sido descobertos se ele não tivesse dado aval para que a 1ª Secretaria investigasse as irregularidades:

- Estou há quatro meses tentando corrigir erros e resgatar o conceito da Casa. Fomos nós que resolvemos apurar isso. Não sei o que é ato secreto. Mas isso tudo é relativo ao passado. Não tenho nada a ver com isso - disse, apesar de estar presidindo o Senado pela terceira vez.

Sarney é contra PF e MP na investigação

Contrário à entrada da Polícia Federal e do Ministério Público na investigação sobre os atos secretos, Sarney se irritou quando parlamentares como Demóstenes Torres (DEM-GO) declararam que a investigação não poderia ficar restrita à Casa. Lembrou que o assunto já é investigado por uma comissão técnica do Senado, cujo relatório deverá ser divulgado segunda-feira, quando estará de volta o 1º secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), que se recupera de uma cirurgia.

Apesar dos constrangimentos das últimas semanas, quando foi obrigado a explicar as contratações de seu neto e de duas sobrinhas, Sarney disse não ter problemas de consciência.

- De quais fatos estou sendo acusado? De que pedi ao senador Delcídio para requisitar uma sobrinha de minha mulher, do Ministério da Agricultura, e que ela fosse indicada para seu gabinete? Ou de que meu neto foi contratado para o gabinete do senador Cafeteira, que já admitiu que não lhe pedi nada? É disso que eu, depois de ter prestado tantos serviços ao país, estou sendo acusado?

Sarney recebeu cumprimentos de praticamente todos os presentes. O primeiro foi Fernando Collor. Depois, senadores se revezaram na tribuna para apresentar sugestões, mas nenhum ousou criticar Sarney. Um dos mais ácidos, Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), só falou em entrevista:

- Era preferível que Sarney não tivesse nem falado. E logo ele que foi presidente da Casa por três vezes e foi quem nomeou Agaciel Maia.