Título: Garras menos afiadas
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 17/06/2009, Economia, p. 15

Arrecadação cai 6% e, pela 1ª vez desde 2003, deve fechar o ano em queda

A arrecadação de impostos e contribuições federais voltou a cair, pelo sétimo mês seguido, e encerrou maio em R$49,8 bilhões. Em termos reais, ou seja, considerando a inflação, a perda de arrecadação foi de 6,06% em relação a 2008. No ano, o recolhimento de tributos recuou quase 6,92% em termos reais, para R$269,7 bilhões. Diante desses dados, a Receita Federal admitiu ontem que, pela primeira vez desde 2003, a arrecadação deve fechar 2009 com queda real.

- Em termos reais, devemos ter uma queda - disse o coordenador-geral de Estudos, Previsão e Análise da Receita Federal, Marcelo Lettieri.

Inadimplência das empresas dobra

A projeção de arrecadação para 2009 é de R$485 bilhões (excluindo-se as receitas previdenciárias). Em 2008, esse valor foi de R$479,5 bilhões. Mas, quando os valores forem corrigidos com base na inflação, o resultado pode ser uma redução em 2009. Em 2003, quando o país enfrentou sua última recessão, a queda na arrecadação foi de cerca de 4%.

Segundo Lettieri, no entanto, o governo não está preocupado. Ele lembrou que a arrecadação está caindo, em parte, por causa de desonerações feitas para combater os efeitos da crise internacional. Entre janeiro e maio, a renúncia fiscal com as medidas anunciadas pelo governo - como a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis, linha branca e materiais de construção - somam R$10,8 bilhões.

- O governo não faz política fiscal olhando apenas a arrecadação. Se for preciso, a arrecadação vai pagar a conta para manter o emprego e a renda no país - disse.

A arrecadação do IPI, por exemplo, caiu 37,41% em maio sobre o mesmo mês de 2008. Já o IPI relativo apenas ao setor de veículos caiu 75,06%.

No acumulado do ano, a arrecadação foi prejudicada pela perda de fôlego da indústria. A produção fabril recuou 14,7% nos quatro primeiros meses do ano, segundo o IBGE. O recolhimento de impostos também foi afetado pela menor lucratividade das empresas (queda de 29,5% no primeiro trimestre, considerando os balanços de 149 companhias listadas em Bolsa) e pelo recuo das importações.

O recolhimento do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) - que reflete a lucratividade das empresas - caiu 11,26% no acumulado de 2009. A arrecadação de Cofins e da Cide também está em queda, de 14,03% e de 75,1%, respectivamente. Isso porque empresas fizeram compensações atípicas de tributos. Entre elas está a Petrobras, que fez mudanças sem amparo legal em seu regime tributário.

- Em 2009, houve R$4 bilhões em compensações atípicas - disse Lettieri, acrescentando que houve um aumento na inadimplência das companhias: - Entre outubro e janeiro, a inadimplência das empresas dobrou.

Segundo Lettieri, as empresas não pagaram um valor que chega a R$1,1 bilhão neste período.

Na indústria, só 14% planejam investir

Os efeitos da crise também aparecem no planejamento das indústrias. Pesquisa da FGV mostra que o percentual de empresas sem programas de investimento passou de 14%, em 2008, para 26% neste ano, no pior resultado desde 2003 (28% da amostra). A FGV consultou 820 empresas entre abril e maio passados.

- Antes do quarto trimestre, acho pouco provável que o investimento tenha recuperação - disse o economista Alloisio Campelo, responsável pela sondagem.

COLABOROU Aguinaldo Novo