Título: O caminho é apertar a fiscalização
Autor: Marsico, Marinus
Fonte: O Globo, 21/06/2009, O País, p. 4

FUGINDO DA VIGILÂNCIA: "Sou um técnico. Não tenho compromisso político"

Procurador junto ao TCU critica tentativa de reduzir poderes do tribunal

A pilha de documentos sobre a mesa de Marinus Marsico, um dos procuradores do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), expõe sua rotina. Responsável por investigações sobre fraudes no governo, no Congresso e nas estatais, este carioca de 48 anos critica tentativas de reduzir poderes do TCU e diz que o caminho para não paralisar mais obras irregulares no país é apertar a fiscalização, que vai coibir os erros. Afirma que, se a Petrobras fosse uma empresa privada, os acionistas já teriam derrubado toda a sua diretoria. No MP há 14 anos, Marsico trabalhou como porteiro de hotel em Copacabana para pagar o curso na PUC. "Entreguei chaves para muita gente que hoje estou processando".

Regina Alvarez e Bernardo Mello Franco

O Congresso discute propostas que podem restringir os poderes do TCU. Uma delas impediria o órgão de paralisar obras por suspeitas de irregularidade. Como avalia essa ofensiva?

MARINUS MARSICO: Nenhuma obra deveria parar. Mas, para que isso aconteça, é necessário que se desenvolvam mecanismos para que os interesses do erário estejam garantidos. Às vezes são centenas de milhões de reais envolvidos. A decisão é muito difícil. Se interromper uma obra milionária acarreta prejuízo social, deixar que ela continue com superfaturamento também acarreta.

Como resolver o impasse?

MARSICO: Há obra que não tem jeito. Algumas afetam de tal forma o meio ambiente que sua conclusão daria mais prejuízos do que interrompê-las. Há casos absurdos de obras superfaturadas em andamento. Temos que punir os gestores, mostrar que não é compensador fazer isso. Se o Congresso acha injusto o que o TCU está fazendo, tem a prerrogativa de não suspender as obras. Alguém precisa assumir o ônus.

O presidente Lula diz que o TCU paralisa muitas obras por problemas insignificantes. A crítica procede?

MARSICO: Quase todos os desvios que passaram por aqui foram superiores a dezenas de milhões de reais.

O presidente disse que Brasília não teria sido construída em cinco anos se o MP e o TCU atuassem como hoje...

MARSICO: Pelo que se diz que foi gasto, talvez não tivesse sido mesmo. Alguma cidade seria construída, mas sairia pela metade do preço.

O governo dá tratamento prioritário às obras do PAC. Isso se reflete na qualidade do uso das verbas?

MARSICO: A criatividade no desvio de recursos públicos é totalmente democrática. É no PAC e fora dele. Um programa dessa magnitude é claro que tem problemas, e problemas sérios. Cabe a nós da fiscalização tentar corrigi-los. Sou um técnico, não tenho compromisso político. Minha função é tentar preservar o erário.

O senhor tem atuado em ações de irregularidades no Congresso. Como avalia a sucessão de escândalos?

MARSICO: O que aparece, estamos fazendo. Cada dia é uma assombração nova que a gente vê. Realmente, está ficando difícil acompanhar. Mas o pior seria não haver um órgão para dar andamento às coisas. Aí seria o caos completo.