Título: Bandeira coletivista
Autor: Rocha, Leonel
Fonte: Correio Braziliense, 03/04/2009, Brasil, p. 8

MST e Comissão Pastoral da Terra encampam formalmente proposta de trocar modelo de lotes individuais por uma concessão de uso para grupos de assentados. Ideia é impedir que beneficiados sejam donos das terras

Assentamentos de hoje são formados por lotes individuais: proposta transformaria propriedades

Carlos Moura/CB/D.A Press - 4/5/00 Desejo ¿A concessão coletiva do uso da terra é o modelo ideal para a reforma agrária¿ Jaime Amorim, da coordenação nacional do MST

Marcelo Ferreira/CB/D.A Press - 6/3/09 O programa do governo não é de reforma agrária e sim de assentamento e de acesso a terra Sergio Sauer, doutor em sociologia rural pela UnB Os movimentos pró-reforma agrária incluíram na pauta de prioridades para este ano o desejo de uma mudança legal para alterar o modelo de concessão de uso da terra pelos camponeses assentados pelo governo. Querem transformar a atual concessão individual feita pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em concessão coletiva dos lotes. É a mesma proposta já defendida formalmente pela Via Campesina e agora encampada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), da Igreja Católica (leia entrevista abaixo). ¿A concessão coletiva do uso da terra é o modelo ideal para a reforma agrária¿, defende Jaime Amorim, um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

A proposta do movimento implica em mudança na atual legislação, que, apesar de proibir a revenda da concessão do lote pelo assentado, não acaba com a evasão ou a desistência, principalmente na Região Norte, onde o controle é mais frouxo e os grupos menos organizados. O modelo coletivista defendido pelos movimentos pró-reforma agrária já existe na forma dos Projetos de Desenvolvimento Sustentáveis (PDS). Hoje, os próprios camponeses reservam parte das áreas para cultivo coletivo. Mas a proporção ainda é considerada insuficiente pelos coordenadores do MST. O movimento chegou a debater a proposta no congresso de 2007, mas não houve definição prática.

A ideia do assentamento coletivista não é nova entre os movimentos pró-reforma agrária. Mas nunca tinha se transformado em bandeira de atuação política. As áreas coletivas nos assentamentos são destinadas à produção de frutas e criação de pequenos animais, por exemplo. Também há um setor misto, semicoletivo, onde parcela do lote é cultivada por várias famílias e a outra parte por um assentado. A terceira fatia do lote é a individual, onde cada família define o que plantar. ¿A manutenção dessa área individual atrasa a organização dos trabalhadores que mantêm a concepção individualista da reforma agrária¿, reclama Charles Trocate, coordenador do MST em Marabá.

Produtividade Entre os estudiosos da reforma agrária no Brasil, a expectativa é de que, sem a mudança nos índices de produtividade das fazendas brasileiras, não há como desconcentrar a terra. Os indicadores foram estabelecidos por portaria em 1975 e os critérios para se fazer os cálculos não consideram a evolução tecnológica experimentada pelo agronegócio desde então. Mesmo sem necessidade de aprovar lei para isso no Congresso Nacional, o governo não tem força política para editar uma nova portaria sem causar grandes dificuldades entre a base governista no Congresso. ¿Sem alterar os índices de produtividade, não haverá terra para ser desapropriada no Brasil, o que limita o programa de reforma agrária¿, alerta a professora Leonilde Medeiros, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

Outro crítico do programa de reforma agrária do governo é o professor Sergio Sauer. Doutor em sociologia rural pela Universidade de Brasília, ele alerta para a incapacidade do governo de desapropriar fazendas, principalmente nas regiões Sul e Sudeste, por falta de um índice de produtividade mais moderno. ¿O programa do governo não é de reforma agrária e sim de assentamento e de acesso a terra¿, critica Sauer. Ele aponta a suspensão das desapropriações de fazendas privadas e a concentração de assentamentos em terras públicas como exemplo. Na concepção do professor, o atual programa oficial não muda a atual estrutura fundiária.