Título: Acuado, Sarney sofre pressão para renunciar
Autor: Vasconcelos, Adriana; Camarotti, Gerson
Fonte: O Globo, 26/06/2009, O País, p. 3

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS

Denúncia contra outro neto agrava situação do presidente do Senado, que acusa a mídia e começa a perder apoio do DEM

Adriana Vasconcelos e Gerson Camarotti

Nova acusação de irregularidade envolvendo um outro neto do senador José Sarney (PMDB-AP), desta vez com o negócio de crédito consignado no Senado, deixou o presidente da Casa numa situação ainda mais difícil, reacendendo o movimento pela sua saída do cargo. Acuado, ele sequer apareceu ontem no Senado. Limitou-se a divulgar nota atribuindo a denúncia a "uma campanha midiática" por dar apoio ao presidente Lula e a seu governo. Seu destino está nas mãos do DEM, que ainda garante a ele maioria. Mas o partido já começa a dar sinais de que poderá mudar de lado, caso Sarney não consiga se explicar a contento.

Segundo reportagem de ontem do jornal "O Estado de S. Paulo", José Adriano Cordeiro Sarney - que até os 19 anos se chamava José Sarney Neto - recebeu, desde 2007, autorização de seis bancos para intermediar a concessão de empréstimos consignados com desconto em folha para servidores do Senado e de outros órgãos federais. Seu carro chefe seriam os empréstimos concedidos pelo HSBC, onde trabalhou.

Na nota em que defende o neto, hoje com 29 anos, Sarney ressalta sua qualificação profissional - mestrado na Sorbonne e pós-graduação em Harvard: "Considero os esclarecimentos prestados pelo meu neto (...) suficientes para mostrar a verdadeira face de uma campanha midiática para atingir-me, na qual não excluo a minha posição política, nunca ocultada, de apoio ao presidente Lula e seu governo".

- Isso é apelação, não argumento. Vamos levar as investigações ao limite - disse o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE).

Outro neto de Sarney, João Fernando Gonçalves Sarney, foi nomeado para o gabinete do senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA) e exonerado por ato secreto. Além dele, pelo menos mais dez parentes e agregados de Sarney foram beneficiados por atos secretos.

A atividade de José Adriano Sarney se assemelha àquela do filho do ex-diretor de Recursos Humanos do Senado João Carlos Zoghbi, que criou uma empresa para intermediar o crédito consignado. O agravante, no caso do ex-diretor, foi usar a ex-babá como laranja em sua empresa, a Contact Assessoria de Crédito. Zoghbi, que responde a inquérito na Polícia Federal e a duas sindicâncias no Senado, teria recebido, só de um dos bancos, R$2,3 milhões. Já o neto de Sarney diz que o faturamento de sua empresa, Sarcris Consultoria, Serviços e Participação Ltda, teria ficado abaixo de R$5 milhões.

A denúncia foi considerada grave pelo comando do DEM, que, pela primeira vez, admitiu a possibilidade de retirar seu apoio a Sarney, mesmo depois de o presidente do Senado ter cedido ao partido o comando administrativo da Casa, com direito à indicação do novo diretor-geral.

- Essa tese de que o partido defende Sarney de forma incondicional não existe - advertiu o presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ).

Mesmo fora do Senado, ontem, o líder do DEM, José Agripino (RN), mudou de tom:

- Meu partido só tem compromisso com a legalidade. Assim como a decisão de apoiar Sarney foi da bancada, caberá a ela decidir se continuará apoiando ele.

Mas o 1º secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), defendeu Sarney:

- Fico intrigado como o avô teria ajudado o neto se uma das primeiras providências que tomou ao assumir a presidência foi limitar em 1,6% as taxas de juros para os empréstimos consignados feitos por bancos conveniados do Senado.

Sindicância sobre contas é cancelada

O deputado Sarney Filho (PV-MA), pai de José Adriano, negou que tenha havido tráfico de influência. Argumentou que a carteira de crédito consignado do Senado representava cerca de 5% apenas do faturamento da empresa do filho. Ele foi à tribuna e classificou a denúncia como uma tentativa de desestabilizar o mandato do pai.

- O meu filho é sócio de uma empresa que faz crédito consignado. A empresa não atuou apenas para o Senado, mas para vários outros órgãos. Ou seja, esse é o trabalho dele. Ele nunca teve favorecimento por ser neto do senador.

Segundo ele, o HSBC já tinha convênio com o Senado antes de José Adriano atuar no órgão:

Procurado pelo GLOBO, José Adriano, que estaria de férias no Maranhão, não retornou as ligações, mas divulgou nota na qual diz que, após ser gerente do departamento de créditos do HSBC, em São Paulo, decidiu atuar no mercado de consignados em Brasília. E afirma que o banco, seu principal cliente, já tinha convênio com o Senado na época da criação de sua empresa.

Por meio de sua assessoria, Sarney anunciou que desistiu da comissão de sindicância para investigar duas contas do Senado, com saldo de R$3.740.994,13, que estavam fora da Conta Única do Tesouro Nacional. Embora mantenha a decisão de encerrar as contas, Sarney se disse satisfeito com as explicações do diretor-geral do Senado, Haroldo Tajra. O diretor disse que as duas contas não são secretas, pois estão incluídas no Sistema Integrado de Acompanhamento Financeiro (Siafi) e recebiam pagamento por serviços prestados pela Secretaria de Informática do Senado, antigo Prodasen, a outros órgãos.