Título: Freio nas dívidas
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 27/06/2009, Economia, p. 25

Nível de endividamento é o mais alto em cinco anos, mas para de crescer com crise

Patrícia Duarte

Ototal das dívidas contraídas pelos brasileiros - para comprar carro, eletrodomésticos, vestuário e imóveis, entre outros - encerrou o primeiro trimestre abocanhando 34,8% da renda anual das famílias, segundo dados divulgados ontem pelo Banco Central. Apesar de ser o patamar mais alto em cinco anos, o percentual não se mexeu na comparação com o quarto trimestre de 2008, o que significa que a crise internacional - que explodiu em setembro - estancou a expansão do nível de endividamento dos consumidores.

A desaceleração no ritmo do endividamento, segundo a autoridade monetária, começou no terceiro trimestre de 2008, com a piora do cenário externo, que restringiu muito o mercado de crédito no país. Com isso, as pessoas tiveram dificuldades de acesso a novas linhas.

Outro indicador divulgado ontem pelo BC e que ilustra esse novo cenário é o comprometimento da renda com a dívida. Ou seja, quanto efetivamente as pessoas retiram de seus salários para pagar seus débitos num determinado período. Em março, ele chegou a 25,3%, queda de 0,8 ponto percentual em relação ao último trimestre de 2008. Isso ocorre, segundo o BC, pela redução das taxas de juros, diante da flexibilização da política monetária.

O endividamento das famílias foi amplamente impulsionado nos anos mais recentes, na carona do aumento consistente da renda, da instituição de novos mecanismos de financiamento, como o crédito consignado (com desconto em folha) e do alongamento dos prazos de pagamento. No período pré-crise, a taxa de expansão anual do volume de crédito na economia encostou em 40%.

A rapidez do movimento é atestada pela curta evolução de indicadores fornecida pelo BC. O patamar, que fechou o primeiro trimestre de 2004 a 15,4% da renda total, mais do que dobrou em cinco anos. O comprometimento de renda, que era de 17,5% em 2004, hoje está em 25,3%.

Para o economista da Tendências Bruno Rocha, o mais provável é que o atual patamar de endividamento, de 35%, não volte a subir até o fim do ano. Justamente porque o mercado de crédito tende a melhorar, mas retomando prazos mais longos e juros mais baixos. Ele lembra que o BC, desde janeiro passado, vem reduzindo a taxa básica de juros. A Selic passou de 13,75% ao ano para os atuais 9,25%.

- Isso faz com que o nível de endividamento, quando se olha a renda, não volte a crescer - afirmou ele, acrescentando que a esperada melhora no mercado de trabalho e na renda também vai jogar a favor.

Apesar de estar em patamar histórico, o endividamento nacional não é tão elevado quando comparado com outros países, especialmente os desenvolvidos. Na França, por exemplo, ele estava em quase 75% no último trimestre de 2008. Mas o diretor da consultoria Rosenberg, Dirceu Bezerra, alerta que, sobretudo neste momento de crise, as pessoas não devem deixar suas dívidas comerem uma parcela muito maior de seus rendimentos:

- O nível de endividamento não pode crescer muito. O nosso salário já é muito tributado e é perigoso comprometer uma parcela muito maior do que a atual com dívidas.

Por isso, as pessoas devem fazer as contas antes de assumir uma nova dívida. Bezerra calcula que, para manter a saúde das finanças domésticas, o certo é não comprometer mais de 35% da renda com empréstimos. O melhor, aconselham os especialistas, é poupar para comprar à vista.

O gosto por calçados e roupas faz a atriz Luciane de Paula comprometer cerca de 50% de seus vencimentos com a compra destes produtos. Segundo ela, em geral, a compra é parcelada em até oito vezes no cartão de crédito e no cheque. Luciane diz que está tentando reduzir os gastos.

- Comprometo muito dos meus vencimentos. Tirando as despesas de casa e com a minha filha, acabo usando meu dinheiro todo em roupas, perfumes e sapatos - diz.

COLABOROU: Erica Ribeiro