Título: De 50 diretores demitidos, 37 mantêm cargo
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 27/06/2009, O País, p. 3

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS

Senado tem 111 chefes de serviço, com gratificação, que só mandam em si mesmos

Chico de Gois

Passados três meses desde que o 1º secretário do Senado, Heráclito Fortes (DEM-PI), anunciou a demissão de 50 servidores que ocupavam cargos de direção, entre os 181 postos identificados, quase nada mudou na estrutura da Casa. Levantamento realizado pelo GLOBO no Portal da Transparência, do próprio Senado, demonstra que somente 13 desses funcionários deixaram a função. Outros 37 ainda mantêm o cargo de diretor. Essa é apenas uma das medidas anunciadas pelo Senado ao longo da crise interna, iniciada em março, que não saíram do papel.

O próprio Heráclito confirmou ontem que parte dos diretores "demitidos" ainda está trabalhando e atribuiu isso às dificuldades da Casa para promover a reforma administrativa que anunciou que fará.

- Temos um estudo que está sendo concluído pela Fundação Getulio Vargas (FGV), que vai traçar o novo quadro funcional do Senado, pois estávamos tendo uma dificuldade para fazer isso - disse Heráclito.

Em alguns casos, os diretores que mantêm o cargo são chefes de departamentos que têm um só funcionário: ele próprio. Como acontece, por exemplo, com as subsecretarias de Publicações Oficiais, de Apoio Técnico e Relações Institucionais, de Documentação e Arquivo, de Redação da Ordem do Dia e a Coordenadoria de Processos Judiciais.

Diretores são transferidos para manter ganhos

Em outros, o diretor tem apenas um funcionário, caso da Subsecretaria de Publicações Oficiais. Houve um caso em que o diretor que deveria ter perdido a função foi transferido para outro setor, mas com o mesmo cargo de chefia - gratificado. Foi o que aconteceu com o ocupante da Subsecretaria de Planejamento e Execução de Convênios, que passou a dirigir a Subsecretaria de Administração de Contratações de Estagiários.

Cargo de chefia é o que mais há no Senado. O levantamento do GLOBO apurou ainda a existência de 111 cargos de "chefe de serviço" onde o chefe é o único funcionário do setor. Há chefe de serviço para todo tipo de trabalho: recuperação de informações bibliográficas, empréstimo e devolução de material bibliográfico, atendimento ao usuário, arquivos especiais, arquivos administrativos, arquivos impressos e até chefe de serviço de elevador.

Diante da crise, o Senado tem sido pródigo em anunciar medidas que, na prática, são executadas num ritmo lento. Esta semana, a prometida transparência sobre os dados do Senado está chegando à internet com o novo Portal da Transparência. Ainda assim, informações sobre contratos e licitações ainda não estão liberadas.

No auge da crise no Senado, a descoberta de que alguns diretores burlavam a lei antinepotismo empregando parentes por meio de empresas de prestação de serviço gerou mais uma promessa de que o desvio seria corrigido. Estima-se que dezenas de parentes estão nessa situação, mas apenas sete foram demitidos na ocasião. Depois, não se tratou mais do assunto.

De 24 gabinetes, 21 devolveram horas extras

Mas algumas promessas já começam a ser cumpridas, ainda que não integralmente. Em março, depois que se soube que o Senado pagara R$6,2 milhões de horas extras a 3.883 funcionários em janeiro, quando o Legislativo estava de recesso, senadores se alternaram na tribuna para dizer que o dinheiro deveria ser devolvido por seus funcionários que não trabalharam no período. Na ocasião, 24 senadores prometeram a devolução. Até agora, funcionários de 21 gabinetes cumpriram a ordem.

Senadores que se valeram da farra das passagens aéreas para viajar ao exterior ou para presentear amigos e parentes, como também fizeram os deputados, não sofreram qualquer punição. Mas o Senado, que anistiou os abusos do passado, criou regras que passaram a valer depois do escândalo: de agora em diante, somente parlamentares e servidores por eles indicados poderão usar as passagens.

A revelação de que o ex-diretor-geral Agaciel Maia valeu-se de 663 atos secretos para fazer contratações, dispensas, promover pessoas e dar reajustes salariais também não apagará o que foi feito. Depois que todos os atos foram identificados, somente um pôde ser anulado: o que estabelece assistência médica vitalícia para diretor-geral e para secretário-geral. Os demais serão analisados caso a caso.