Título: A reforma que faliu
Autor: Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 21/03/2009, Política, p. 2

Funcionários da empresa contratada para realizar obras em imóveis funcionais na Asa Norte estão parados e sem salários

Apartamentos da 302 Norte: desde o início das obras, empreiteira vinha sendo multada por não cumprir cronograma Apontada como a solução para acabar com o auxílio-moradia dos deputados, a primeira etapa da reforma dos apartamentos funcionais da Câmara empacou. Iniciada há um ano, a remodulação de 96 imóveis está paralisada há pelo menos dois meses. O contrato dos blocos F, G, H e I da SQN 302 previa que fossem refeitos ou trocados pisos, esquadrias, encanamento, fiação elétrica, elevadores, telhados e o acabamento. Mas quem visita as instalações da obra, inacabada, confirma o que os administradores da Câmara admitem em privado: ela não será entregue em maio próximo, conforme previsão inicial.

A reforma dos imóveis está orçada em R$ 30,2 milhões, dos quais já foram repassados R$ 9,6 milhões, segundo a ONG Contas Abertas, para a Palma Engenharia, empreiteira responsável pela obra, com sede em Fortaleza (CE). A reportagem esteve anteontem na quadra residencial e constatou que não há sinal dos cerca de 200 trabalhadores que atuavam na obra. Apesar da vigilância na entrada dos prédios, os primeiros sinais de abandono são visíveis: pastilhas recém-colocadas começam a cair, pisos e rebocos, expostos, estão desgastados por causa da ação do tempo e da falta de proteção da obra.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Construção e do Mobiliário de Brasília (Sticmb), Edgar de Paula Viana, tem ouvido desde o mês passado queixas dos empregados da Palma, que, segundo ele, estão com salários e vale-transporte atrasados. A Palma, afirma o sindicalista, deu férias coletivas aos trabalhadores, porque não teria recebido recursos da Câmara. A empreiteira, segundo Edgar, comprometeu-se a pagar a dívida de R$ 200 mil com os funcionários na próxima semana.

Temendo represálias, um funcionário ouvido sob a condição do anonimato recebeu, depois de tirar 30 dias de folga, o aviso das férias coletivas a partir de janeiro. No entanto, o trabalhador que ganhava R$ 800 da Palma para tocar a obra diz ter R$ 5 mil para receber em rescisões contratuais e obrigações trabalhistas. ¿Não pagaram nem minhas férias¿, conta ele, que não vai mais à obra. Mesmo sem receber os R$ 7 diários do vale-transporte, outro funcionário continua trabalhando. Guarda a cancela de um dos prédios cuja reforma foi interrompida, na esperança de receber os R$ 2 mil pelos meses de trabalho não pagos.

Protesto No início da semana, cerca de 50 funcionários fizeram um protesto na SQN 302 por causa da paralisação das obras. A Polícia Militar chegou a mandar reforço policial com receio de eventuais tumultos e saques de materiais. ¿É um absurdo uma empresa que toca uma obra dessas não ter capital de giro para pagar os funcionários¿, critica o presidente do sindicato.

Desde o início dos repasses, a Câmara já havia ligado o sinal amarelo sobre a capacidade da empreiteira em honrar as etapas de execução da obra. A empresa recebeu, segundo os boletins administrativos da Casa, várias multas por descumprimento do cronograma. Ocupante dos principais cargos da empreiteira, o diretor comercial da Palma, Heitor Studart, é filho do ex-deputado federal Paulo Studart, parlamentar pela Arena e pelo PDS entre 1975 e 1983. Procurado por telefone em Fortaleza, Studart não retornou as ligações. ¿Só podia ter deputado no meio¿, critica Edgar de Paula.