Título: Alta de preços pode ameaçar economia global
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 01/07/2009, Economia, p. 19

Estímulos fiscais para conter a crise pode levar a alta da inflação quando países voltarem a crescer

Eliane Oliveira

BRASÍLIA. O dragão que o Brasil domou há exatos 15 anos - em 1º de julho de 1994, quando entrou em circulação o real, dando fim à inflação galopante - agora paira como ameaça à economia global. O desequilíbrio entre oferta e demanda pode ser um fator de fomento da inflação mundial, no momento em que os países começarem a se recuperar da crise financeira, na visão de especialistas. Além disso, o comportamento dos preços das commodities e as consequências do aumento do endividamento público em diversos países que lançaram vultosos pacotes monetários e fiscais terão peso significativo na evolução global dos preços. No caso do Brasil, que conseguiu reagir melhor que outros parceiros internacionais às turbulências, o risco é menor.

Segundo o Banco Central (BC) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), há hoje três grupos de economias: as que viveram rápido processo de queda da inflação e que hoje estão com deflação (queda generalizada de preços), como EUA, Japão e China; aquelas com queda acentuada da inflação, mas sem um quadro de deflação, casos de Chile, África do Sul e Turquia; e as com redução mais modesta da inflação, como o Brasil.

- Cada país tomou várias medidas e, mesmo assim, houve redução da produção industrial, o que levou à queda da inflação. O Brasil não ficou imune a esses movimentos - disse o diretor de Política Econômica do BC, Mário Mesquita, ao divulgar o Relatório Trimestral de Inflação.

Risco inflacionário para o Brasil é menor

O coordenador de análises econômicas do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas, Salomão Quadros, acha que um aumento da inflação mundial, que no ano passado atingiu em média 5,9%, ainda vai demorar. Para ele, os EUA têm possibilidade de se recuperar mais cedo e os mais otimistas apostam numa retomada da atividade industrial americana entre o fim deste ano e o início de 2010, ainda que haja queda forte do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país):

- As expectativas são de recuperação gradativa. O resto do mundo está no mesmo passo. Se houver aumento de preços, os países podem perfeitamente mudar suas políticas monetárias e aumentar os juros, inclusive o Brasil, que foi menos atingido pela crise.

Francisco Pessoa, economista da LCA, afirma que o grande enigma é o impacto dos pacotes monetários:

- A questão ainda está em aberto. Acho que ninguém tem condições de dar uma resposta muito precisa.

Ele lembrou que os pacotes de incentivos fiscais, em geral, são temporários. Destacou que não se sabe exatamente quanto o movimento das commodities se devia a um cenário de oferta e demanda, antes da piora da crise, em setembro passado, ou à especulação.

- A economia mundial vai cair, mas em quanto tempo retomará o nível anterior? Meu grande temor é que a gente volte a um nível de demanda mais cedo do que a oferta possa acompanhar.

Na visão do professor Alcides Leite, da Trevisan Escola de Negócios, o momento atual é de recessão e o melhor caminho a ser tomado é a busca de um maior controle da inflação.

- No momento de recuperação, pode haver certo desequilíbrio entre oferta e demanda, com os estoques baixíssimos. Sem contar que os juros estão baixos na maioria dos países. Isso pode ajudar a aumentar o consumo - afirmou Leite.

No Brasil, pondera Leite, a situação é diferente. Embora os juros tenham caído, as taxas ainda estão altas, o gasto público está mais equilibrado e não houve recessão muito rigorosa. Não foram desativadas fábricas e unidades produtivas em geral. Ele lembrou que os preços das commodities estão subindo e países emergentes com peso no comércio mundial, como China e Índia, estão crescendo.

- As commodities mais aquecidas podem gerar certa pressão inflacionária no Brasil, mas nada muito forte.Tudo indica que teremos uma inflação entre 3% e 4% e um crescimento de até 1%, no máximo - disse Leite.

COLABOROU Patrícia Duarte