Título: Bancos recebem 10 vezes mais que país pobre
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Fonte: O Globo, 25/06/2009, Economia, p. 27

Em 1 ano, socorro a instituições somou US$18 tri. Nações em desenvolvimento tiveram US$2 tri em 49 anos

Marília Martins*

NOVA YORK. A indústria financeira dos países desenvolvidos recebeu em um ano quase dez vezes mais recursos do que todos os países pobres em quase meio século, segundo análise feita por especialistas da Campanha da ONU sobre as Metas do Milênio. Em 49 anos, as nações em desenvolvimento receberam o equivalente a US$2 trilhões em doações oferecidas por países ricos. Só no último ano, a ajuda pública concedida a bancos e grandes instituições financeiras foi de pouco mais de US$18 trilhões.

O estudo serviu de base para o documento de abertura da Conferência Econômica, ontem, na sede na ONU, em Nova York, que tem por objetivo debater a crise financeira mundial e seus efeitos sobre as economias pobres. O encontro vai até amanhã. A análise também servirá de base para o relatório 2009 sobre as Metas do Milênio, que será lançado em julho.

- O contraste agudo entre a soma destinada a ajudar a combater a pobreza em 49 anos de negociações, muitas vezes dolorosas, e as assombrosas quantias empregadas da noite para o dia para ajudar as instituições financeiras nos países ricos, que criaram a crise atual, faz com que não seja mais possível para os governos sustentar o argumento de que não há como arrumar dinheiro para salvar as 50 mil pessoas que morrem de fome a cada dia no mundo - disse Salil Shetty, diretor da campanha da ONU para o Milênio.

ONU: "Arca de Noé para salvar sistema econômico"

A conferência iniciada ontem foi convocada pelo nicaraguense Miguel D"Escoto, presidente da Assembleia Geral da ONU. Estão em Nova York representantes de 142 países. Entre eles, os presidentes do Equador, Rafael Correa; da Bolivia, Evo Morales, e da Venezuela; Hugo Chávez. O presidente Lula não comparecerá ao encontro.

D"Escoto aproveitou a abertura da cúpula para criticar "o modo egoísta de viver e consumir" que domina a sociedade e pediu mais ética para ajudar aos países pobres.

- Não é humano construir a arca de Noé para salvar o sistema econômico imperante, deixando o resto da humanidade à sua própria sorte - disse. - O egoísmo e a ambição devem ser substituídos pela solidariedade, e isso implica uma mudança radical.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, por sua vez, lembrou que, no encontro de Londres do G-20 (grupo que reúne as 20 principais economias do mundo), os países assumiram o compromisso de elevar a mais de US$1 trilhão o suporte financeiro às nações pobres afetadas pela crise. A ONU estima que os 60 países mais pobres terão, no fim de 2009, até 143 milhões de pessoas a mais em condições de miséria.

- O impacto da crise atual pode ainda durar anos porque milhões de famílias estão sendo empurradas para a pobreza e mais de 50 milhões de postos de trabalho estão ameaçados este ano - disse Ban Ki-Moon.

O documento final da assembleia pede políticas conjuntas para incrementar a criação de empregos e facilitar o acesso aos serviços de saúde e à educação, além da reforma imediata do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional.

(*) Com agências internacionais