Título: Diante de ditadores, Lula pede condenação a golpe
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Fonte: O Globo, 02/07/2009, O Mundo, p. 32

Presidente discursa em reunião da União Africana, na presença do sudanês Bashir

SIRTE, Líbia. Cercado por ditadores e por governantes acusados de se eternizarem no poder através de eleições fraudadas ou de intimidação, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez ontem um apelo aos líderes da África para que condenem o golpe que tirou do poder Manuel Zelaya, em Honduras.

¿ Queria pedir que, em seu comunicado final, esta reunião inclua uma negativa ao golpe de Estado que acaba de ocorrer em Honduras, no domingo passado, e que o presidente eleito democraticamente volte ao poder ¿ solicitou o presidente, que discursou ontem como convidado na 13aAssembleia da União Africana (UA).

O encontro de ontem foi realizado na cidade natal do ditador líbio, Muamar Kadafi, que é o atual presidente da União Africana e que completará 40 anos no poder em seu país dentro de dois meses. Entre os participantes estava o ditador do Sudão, Omar al-Bashir, que foi condenado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), da ONU, por crimes de guerra e contra a Humanidade ¿ o Brasil, que ratificou o tratado que criou o TPI, tem obrigação legal de prender Bashir caso ele entre em seu território.

Entre os pontos que podem ser mencionados no mesmo documento final no qual o presidente Lula pretende incluir a menção ao golpe em Honduras está um trecho polêmico. Um dos relatórios que serão discutidos pela UA se refere ao ¿abuso do princípio da jurisdição universal¿, uma crítica à condenação de Bashir pelos crimes contra os civis na região de Darfur.

Antes mesmo de discursar diante dos líderes africanos, o presidente brasileiro disse, na Líbia, que o Brasil não aceita o golpe em Honduras.

¿ Não aceitamos a volta dos golpes na América Latina. Tivemos a experiência dos golpes militares durante os anos 60 do século passado ¿ disse o presidente.

¿ A democracia significa que você pode retirar seu presidente de madrugada e colocar outro? Esse é um precedente perigoso para a comunidade internacional como um todo. Deixamos de aceitar todas as formas de cooperação com Honduras, porque eles têm que respeitar o processo democrático.

No discurso na UA, Lula defendeu colaboração na produção agrícola.

¿ A cooperação sul-sul é uma força, e é preciso que se possa traduzir em uma troca de conhecimentos e experiências para realizar o desenvolvimento sustentável

Ahmadinejad, convidado, não comparece à reunião

Na verdade, o presidente brasileiro acabou por se livrar de um constrangimento. O presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad ¿ cuja reeleição aparentemente fraudada motivou protestos de rua, combatidos com brutalidade pelo governo dos aiatolás ¿ não compareceu à reunião, cancelando sua chegada na última hora. O convite ao iraniano, feito por Kadafi, fora recebido com reservas por muitos líderes africanos, que temiam que sua presença acabasse por alterar a agenda da reunião.

Outra ausência sentida foi a do presidente do Egito, Hosni Mubarak, que nos últimos meses demonstrou desagrado com algumas propostas de Kadafi, principalmente a criação de um bloco regional com mais poderes, chamado ¿Estados Unidos da África¿.