Título: Lula recebe Sarney, e Dilma defende aliado
Autor: Damé, Luiza; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 04/07/2009, O País, p. 8

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS: Presidente do PSDB classifica interferência de Lula como "vergonha nacional"

Ministra afirma que presidente do Senado não pode ser "jogado aos leões" e cobra responsabilidade do DEM na crise

Luiza Damé e Isabel Braga

BRASÍLIA. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), conversaram ontem por quase duas horas, sozinhos, mas coube à ministra Dilma Rousseff, chefe da casa Civil, fazer uma defesa enfática do presidente do Senado, principal entusiasta do apoio do PMDB à sua candidatura em 2010. Dilma entrou para valer na guerra pela permanência de Sarney no cargo.

A ministra disse que o senador não pode ser demonizado e apontado como o único responsável por atos cometidos nos últimos 14 anos. E cobrou também a responsabilização do DEM, partido que ocupa a 1ª secretaria da Mesa há vários mandatos, por irregularidades nos contratos do Senado.

- Tem uma prática no Brasil que não está correta, que é achar que sempre que você pega uma pessoa e joga ela aos leões, e está no caminho de solucionar as questões éticas. Como gestora, quem são os responsáveis pelos contratos? Soube eu que é a 1ª secretaria (responsável pela gestão dos contratos). Soube eu que os integrantes sempre foram do DEM. E, estranhamente, o DEM pede o afastamento do presidente Sarney - argumentou Dilma. - Não é plausível, me desculpem, que, pelo tamanho da crise, pelo prazo da crise e pela quantidade de atos, que era possível ter sido praticada por uma só pessoa. Então não concordo em demonizar o presidente Sarney.

Ministra diz que governo quer apuração, e não "pizza"

Dilma acrescentou, várias vezes, que o governo defende a apuração de todos os fatos e que nada deve ser ocultado. E refutou a ideia de que o governo quer patrocinar uma "pizza" no Senado, ao pregar a permanência de Sarney no comando da Casa.

- Tem um modelo no Brasil que dá pizza: esconder a questão debaixo do tapete. É assim: pega a pessoa, liquida ela (sic), torna ela (sic) responsável por tudo e, aí, o que que se faz? Se esconde todos os malfeitos - argumentou Dilma.

A ministra citou o Portal da Transparência do Executivo e insinuou que os demais poderes - Legislativo e Judiciário - deveriam seguir o exemplo e dar visibilidade a seus gastos, seguindo a lei brasileira que é "bastante evoluída", segundo Dilma.

A oposição apontou uma falha na defesa que Dilma fez de Sarney: afirma que não são apenas os atos secretos irregulares que o enfraquecem, mas as várias denúncias pessoais contra o senador, evidenciando que Sarney e a família exercitam, com desenvoltura, o patrimonialismo - contratam parentes; usam dinheiro do Senado para pagar empregados particulares. Um de seus netos tem contratos para empréstimos consignados a servidores da Casa.

O líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN), reagiu à fala da ministra, acusando-a de tentar desviar o foco das investigações ao cobrar que os senadores do DEM que comandaram a 1ª secretaria do Senado também sejam investigados.

- A ministra, espertamente, tangenciou, passou ao lado disso (das denúncias de patrimonialismo que pesam contra Sarney) e está querendo desviar o foco das investigações, que é o de investigar quem é acusado. Que conversa é essa? Não tem ninguém do DEM acusado. Se vier a ter, será investigado - rebateu Agripino.

O líder do DEM afirmou ainda que Dilma, antes de falar sobre o tema, deveria conhecer como é o funcionamento do Senado:

- A decisão sobre contratos passa por um colegiado, eles são homologados pela Mesa Diretora. A nomeação do diretor-geral é o presidente quem faz. Se o PT faz restrição, por que quando Tião Viana presidiu a Casa não demitiu Agaciel Maia (ex-diretor-geral)?

"PT quer é acolher seus interesses político-eleitorais"

Para Agripino Maia, o PT e o presidente Lula não querem ver apurados os desvios e as denúncias que pesam sobre Sarney, e pensam apenas em seus interesses políticos-eleitorais. O líder ironizou o fato de a bancada do PT ter mudado de posição depois de conversar com o presidente Lula.

- O PT não quer contribuir para que a investigação ocorra, quer é acolher seus interesses político-eleitorais. Os senadores querem a instituição recuperada; a bancada do PT pensava assim, mas agora segue Lula - criticou.

O presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), classificou de "interferência escandalosa" as intervenções do presidente Lula nos problemas internos do Senado.

- O que move o presidente Lula não é a recuperação do Senado. Mas, sim, garantir uma base de apoio para a candidata dele no próximo ano. Essa é uma interferência escandalosa. Por isso, vamos remeter essa crise para Lula. Essa interferência é uma vergonha nacional - condenou.