Título: Risco de pane no setor elétrico
Autor: Paul,Gustavo ; Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 05/07/2009, Economia, p. 35

Governo está dividido quanto a destino de concessões a partir de 2014 e sofre pressão política para prorrogá-las

Gustavo Paul e Mônica Tavares BRASÍLIA

CURTO-CIRCUITO

O destino das atuais concessões do setor elétrico brasileiro pode gerar um curtocircuito nas relações entre governo e investidores privados e promete ser uma das grandes polêmicas envolvendo o Congresso nos próximos meses. Uma comissão estuda desde o ano passado o que fazer, a partir de 2014, com 58 usinas que respondem por 21% do parque gerador.

Também vencerão 73 mil quilômetros de linhas de transmissão (82% do sistema). E até 2017 acabam as concessões de 41 das 64 distribuidoras de energia. Se seguir a Constituição e a legislação, a União levará tudo a leilão. Mas há uma corrente que defende a prorrogação dos contratos, admitiu ao GLOBO o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.

Um dos integrantes da comissão, o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, explica por que o governo e os empresários do setor têm pressa.

Apesar de a maioria das concessões vencer em 2015, os anos de 2012 e 2013 também são marcos importantes, pois é quando terminam os contratos de venda de energia velha pelas geradoras às distribuidoras.

Será, então, aberta a temporada de negociações entre os agentes do setor, que por sua vez determinam os ritmos de investimento, produção e rentabilidade dos negócios.

Para isso, é fundamental que esteja claro o destino dos empreendimentos existentes. Portanto, o horizonte de decisão da União é ainda mais curto, de três anos.

As concessões já foram prorrogadas em 1995, por 20 anos. Segundo cálculos de consultores, só as concessões das geradoras brasileiras valeriam cerca de R$ 175 bilhões, considerados preço médio e contrato de 20 anos e descontados os custos de operação e manutenção e a depreciação dos ativos.

Para se ter uma ideia do tamanho do desafio, as usinas listadas poderiam abastecer a Região Metropolitana do Rio por cinco anos. Além disso, empresas como Chesf e Cemig têm uma quantidade imensa de unidades vencendo ao mesmo tempo: se perderem muitas licitações, podem encolher um bocado e até mesmo desaparecer.

Há quem aposte no mercado que a prorrogação dos contratos atuais de geradoras, transmissoras e distribuidoras está praticamente acertada pelo governo. Mas Hubner garante que nem mesmo a renovação das concessões das distribuidoras, que recebem investimentos constantes e são fiscalizadas, está definida.

¿ Não tem decisão de nada. Eu não defendo (a prorrogação) porque tenho dúvidas. Não seria um bom teste em 2015 fazer a licitação e saber quem quer assumir uma distribuidora reduzindo o valor da tarifa? ¿ pergunta.

Renovação com uma tarifa menor é opção

A única certeza até agora, segundo o diretor-geral, é que está descartada completamente a possibilidade de o governo realizar qualquer tipo de licitação das concessões pelo maior valor da outorga: ¿ Vai ser pela menor tarifa, com certeza.

Esta tem sido a prática do governo nas licitações para os empreendimentos novos, como aconteceu nas usinas de Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira.

E o governo também já prometeu o mesmo esquema para a licitação de Belo Monte, no Rio Xingu, prevista no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para ser licitada em setembro ou outubro deste ano.

O ministro Lobão informa que o estudo da comissão está quase pronto e deverá ser entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em algumas semanas. Mas, como o caminho a ser definido demandará uma solução legislativa, com a aprovação de uma emenda constitucional e depois de um projeto de lei regulamentando o assunto, o tema pode não ser resolvido ainda na gestão Lula: ¿ Embora esse assunto vá pipocar em 2015, que para o setor elétrico é amanhã, não podemos deixar um problema dessa magnitude para o próximo governo. Temos que, pelo menos, tentar encaminhá-lo agora, ainda que se conclua no próximo governo.

Não podemos deixar de tentar equacionálo ¿ afirma Lobão.

Fazer novas licitações, como manda a Constituição, diz Lobão, é viável, mas traz muitas implicações jurídicas, técnicas e políticas. No entanto, o mesmo se pode dizer em relação à simples prorrogação das concessões, como quer parte do setor.

Uma complicação adicional é que dentro do próprio governo o tema não é pacífico. Segundo uma fonte da equipe econômica, o desafio é encontrar um meio termo. O governo não quer a prorrogação automática das concessões, nem pretende permitir que todas as concessões sejam licitadas. Até agora, diz a fonte, não há solução desenhada.

Uma das hipóteses que surgiram é propor a renovação das concessões mediante compromissos de redução de tarifas, já que os investimentos estariam amortizados.

¿ O legislador, quando fez as regras em 1988, não previu a confusão que seria fazer novas licitações para o setor. Como ficam as benfeitorias, os ativos e os investimentos realizados pelos concessionários nos últimos anos? Como mensurar isso e indenizá-los? ¿ pergunta esta fonte.

Para o setor elétrico, 2015 é amanhã. Não podemos deixar esse problema para o próximo governo EDISON LOBÃO, ministro de Minas e Energia