Título: Caderneta na mira do investidor
Autor: Rodrigues, Eduardo ; Beck,Martha
Fonte: O Globo, 07/07/2009, Economia, p. 21

Aplicação capta R$1,78 bilhão em junho e analistas já veem migração dos fundos

Eduardo Rodrigues, Martha Beck e Felipe Frisch

Acaptação líquida (depósitos menos saques) da poupança voltou a crescer em junho e, pela primeira vez, o resultado acumulado no ano ficou positivo em R$1,71 bilhão. No mês passado, os depósitos na caderneta superaram os saques em R$1,788 bilhão, na maior captação líquida mensal do ano. Na opinião de especialistas, o movimento já pode ser um reflexo da migração de investidores dos fundos de renda fixa para a caderneta, que ficou mais atraente devido à queda dos juros básicos da economia para o inédito patamar de um dígito.

Em junho, os depósitos na poupança somaram R$71,712 bilhões, enquanto as retiradas ficaram em R$69,923 bilhões. Em contrapartida, os fundos de investimento DI e de renda fixa, que compram títulos públicos atrelados à taxa básica de juros Selic, atualmente em 9,25% ao ano, têm perdido recursos. Os DI (pós-fixados, que acompanham a variação dos juros) perderam R$2,751 bilhões no mês passado. Foi o segundo mês consecutivo de resgates líquidos nesses fundos, que, no ano, já perderam R$7,847 bilhões.

Como há a expectativa entre analistas de que os juros não vão cair muito mais, até os fundos de renda fixa, prefixados, que levam vantagem em caso de uma queda mais acentuada da Selic, começaram a perder aplicações. Em junho, R$1,847 bilhão deixou esses fundos, segundo a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid). No ano, essas carteiras ainda registram captação positiva de R$7,235 bilhões.

- Apesar da negação do governo, o resultado já mostra claramente o início da migração da renda fixa para a poupança, principalmente de valores até R$60 mil. Acima disso, ainda é mais vantajoso permanecer nos fundos - diz o diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), Roberto Vertamatti.

Além de não pagar taxa de administração, a caderneta é isenta de Imposto de Renda (IR). Com os recentes cortes nos juros básicos, a remuneração de muitos fundos acaba sendo menor do que o ganho garantido na poupança, de 0,5% mais Taxa Referencial (TR) ao ano. Mas alguns analistas acreditam que ainda é cedo para afirmar que está havendo uma migração.

- Agora que as pessoas vão receber os extratos de seus fundos e começar a comparar - diz o administrador de investimentos Fabio Colombo, que cita o fato de os fundos terem rentabilidade diária como vantagem.

Bancos reduzem taxa de administração

O estrategista de investimentos pessoais do Santander Real, Aquiles Mosca, diz que não notou recentemente uma migração diferente da que já vem ocorrendo nos últimos oito meses: de cerca de R$12 milhões ao mês para a poupança. Mas, como medida preventiva, a instituição reduziu a partir deste mês a aplicação mínima de 14 fundos DI e de renda fixa que cobram taxa de administração mais baixa, em alguns casos de R$100 mil para R$30 mil, de R$50 mil para R$10 mil e de R$10 mil para mil reais.

Recentemente, Bradesco, Itaú e HSBC anunciaram medidas semelhantes. E Banco do Brasil e Caixa reduziram suas taxas de administração em fundos DI e de renda fixa. De acordo com cálculos do matemático José Dutra Sobrinho, com a atual Selic, os fundos DI e de renda fixa que cobram taxas superiores a 1,5% ao ano já entregam ao investidor um ganho menor do que o da tradicional caderneta de poupança.

Em maio, de olho no risco de migração de recursos da caderneta para os fundos, o Ministério da Fazenda anunciou duas frentes de atuação. De um lado, estabeleceu uma intrincada fórmula de tributação, a partir de 2010, de parte dos depósitos na caderneta que excederem os R$50 mil. De outro, adiantou que poderia reduzir a tributação sobre fundos de investimento.

Mas, apesar do forte aumento dos depósitos da poupança nos últimos 60 dias, o governo entende que o movimento ainda não é significativo. Avalia-se que ainda não é necessário fazer mudanças na tributação dos fundos de investimento. Segundo um assessor do ministro da Fazenda, Guido Mantega, enquanto os fundos têm mais de R$500 bilhões em depósitos, a poupança tem cerca de R$200 bilhões.

- Os depósitos líquidos na poupança nos dois últimos meses somam R$3,15 bilhões. Isso equivale a cerca de 0,6% do total existente nos fundos. Não é relevante - disse o técnico.

Em junho, os fundos DI e renda fixa acumularam, em média, rentabilidade de 0,79%, segundo a Anbid. No ano, os fundos DI rendem 5,47%, em média, e os de renda fixa, 5,64%, enquanto a caderneta acumula ganho de 3,58%.