Título: Vitória parcial
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Fonte: O Globo, 12/07/2009, Opinião, p. 6

Passados quinze anos do lançamento do Plano Real, a economia brasileira reúne hoje condições favoráveis a um ciclo de crescimento sustentável logo que o cenário internacional assim o permitir. O desafio inicial do plano era debelar a inflação, e, neste sentido, o plano de estabilização foi muito bem-sucedido.

A população percebeu que havia uma chance concreta de o país se livrar desse flagelo crônico, e rapidamente adotou a nova moeda com um sentimento de esperança surpreendente.

Os benefícios que uma moeda confiável trouxe para a economia brasileira ainda continuam a ser colhidos.

Os horizontes para investimentos se alargaram, contribuindo para que o país se mostrasse mais resistente a crises, como a que quase devastou os sistemas financeiros pelos quatro cantos do planeta meses atrás. Mas o que se conquistou até aqui representa ainda uma vitória parcial. A inflação brasileira vem se mantendo acima da média internacional ¿ e até mesmo acima da média de economias emergentes ¿, fato em parte explicado pelo longo período de convivência com variações ultraelevadas nos índices de preços. O Real obteve êxito porque permitiu que a grande maioria dos preços de bens e serviços se recompusesse de uma única vez, mas graves desequilíbrios estruturais persistiram.

Além disso, a estabilidade monetária possibilitou o país a enfrentar outros grandes desafios, como o da imensa desigualdade social. Avanços significativos também ocorreram nesse campo, porém os resultados demandarão tempo. Como a estabilidade monetária é condição necessária para se dar novos passos adiante, a fim de se firmar o Real precisa ter como retaguarda bons fundamentos, entre os quais a progressiva melhora nos índices de avaliação das finanças públicas.

E é exatamente nesse ponto que existem riscos de retrocesso. Com base em uma carga tributária crescente ¿ processo que, sabidamente, não pode ser perpetuado ¿, rumo a estonteantes 40% do PIB, o governo tem assumido compromissos de aumento definitivo de despesas correntes que acabaram invertendo a trajetória das finanças públicas. Caso a arrecadação não venha a se recuperar na mesma proporção, crise fiscal, alta dos juros.

Há tempo suficiente para se estancar esse processo. O setor público como um todo ainda acumula superávits primários e a dívida líquida está em patamar (como percentual do Produto Interno Bruto) administrável (pouco acima de 40% do PIB). No entanto, vários sinais amarelos já apareceram, e para desligá-los o país precisa retomar o rumo da austeridade fiscal. Não há conquista definitiva em política econômica.