Título: Postos em favela são fonte de corrupção
Autor: Costa, Ana Cláudia
Fonte: O Globo, 12/07/2009, Rio, p. 4

Novo comandante da PM diz que vai implantar mais Unidades de Polícia Pacificadora e usar Bope em vias expressas ENTREVISTA Coronel Mário Sérgio Em seu gabinete repleto de pastas e relatórios espalhados sobre as mesas, o coronel Mário Sérgio de Brito Duarte fala com entusiasmo de sua nova missão: comandar a Polícia Militar e melhorar a segurança no estado. De pronto, ele anuncia que vai usar já na próximas semanas homens da tropa de elite da PM para garantir a tranquilidade de motoristas na Avenida Brasil e nas linhas Amarela e Vermelha. O novo comandante também planeja instalar postos de observação blindados, com 20 metros de altura, nessas vias expressas. Com a intenção de mexer nas estruturas da corporação bicentenária, o coronel garante que vai acabar com os Postos de Policiamento Comunitários (PPCs) em favelas. Segundo ele, a corrupção minou essas unidades. O senhor já tem um plano para o policiamento ostensivo nas vias expressas onde os assaltos amedrontam os motoristas? CORONEL MÁRIO SERGIO: Estamos montando um plano emergencial para a redução de delitos. Nós temos às margens dessas vias um sem-número de favelas. Não quero criminalizar a pobreza, mas a maior parte dos bandidos que agem ali sai dessas favelas. Por isso, vamos ter uma espécie de cinturão de segurança e, para isso, é preciso ter ações de repressão e prevenção. A longo prazo, eu quero ter bases fixas panorâmicas, postos de observação. Por exemplo, posso ter um posto desse blindado, com cerca de 20 metros de altura, na Ilha dos Macacos (às margens da Linha Vermelha), em frente ao Morro do Timbau, na Maré. De lá, o policial vai tomar conta de verdade do que está acontecendo na via. Isso não cria segregação social. Mas o que vai acontecer de imediato nas vias expressas? CORONEL MÁRIO SERGIO: Vamos potencializar o patrulhamento. Mais homens nas linhas Amarela e Vermelha e na Avenida Brasil. Estou fazendo os últimos ajustes na operação que faremos. Vamos fazer isso em breve. Breve significa que semana que vem está ficando longe. Quero, no máximo, na semana que vem ter isso executado. Vou precisar usar o Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) nisso, que é a unidade capacitada para trabalhar nas comunidades com melhores resultados. Teremos também o Batalhão de Choque e os batalhões de área. Todos fazendo grandes operações nessas vias nos horários que os dados estatísticos indicam a incidência de crimes. O senhor disse que vai acabar com os postos de policiamento nas favelas. Por que isso vai acontecer? CORONEL MÁRIO SERGIO: Os PPCs (Postos de Policiamento Comunitário) e DPOs (Destacamentos de Policiamento Ostensivo) não servem para a população, para nada. Existe uma negociação com o crime para o policial entrar (na favela). Existe uma fonte de corrupção porque, se o policial não se corromper, ele morre. Vamos acabar com isso. Se não presta um serviço à população, não serve para a polícia. A história não pode nos engessar. E os Grupamentos de Policiamento em Áreas Especias (Gpae)? Esses também vão ser fechados? CORONEL MÁRIO SERGIO: Também vou acabar com o Gpae. O problema é que o Gpae perdeu força ao longo do tempo. A intenção é que, a longo prazo, eles sejam transformados em Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que é o braço forte do Estado, com uma interface com a população. O Pavão-Pavãozinho (em Copacabana, onde há um Gpae), muito provavelmente, vai ter uma UPP. O Gpae do Morro da Providência (no Centro) também deve ser transformado em UPP, mas eu ainda não tenho isso acertado. E o que fazer para os policiais das UPPs não cederem à corrupção? CORONEL MÁRIO SERGIO: Vamos nos esforçar muito para a UPP não perder a força porque nunca tivemos um programa com tamanha aceitação da população. Isso já foi comprovado em pesquisa. No dia de sua posse, o senhor disse que não iria aceitar autos de resistência forjados. Como isso vai funcionar? CORONEL MÁRIO SERGIO: Isso é indesejado. Não posso partir do princípio, como partem alguns, de que o estado vitimou um inocente. Não posso acabar com o "estatuto", digamos assim, do auto de resistência. Como vou mobilizar o policial para entrar numa favela como a Maré, para oferecer sua carne ao aço do traficante, se ele sabe que pode ser preso se houver morte? Nós vamos estar atentos para autos de resistência forjados. É ruim em todos os aspectos, até para o policial. Nós seremos os primeiros a responsabilizar os que agem assim. Daremos todo apoio aos nossos policiais, mas não vamos compactuar com coisas erradas, com o crime, com a contravenção. Com tantas mudanças, como os praças estão vendo o seu comando? CORONEL MÁRIO SERGIO: Acho que até agora estão vendo com bom olhos porque eu e minha equipe chegamos para trabalhar e mudar. Um exemplo é o treinamento para cabos, soldados e sargentos em cursos no exterior. Os praças também têm que fazer viagem de instrução. Os três primeiros colocados nos cursos terão essa oportunidade. E o salário? CORONEL MÁRIO SERGIO: Esse tem que ser o melhor possível. O governador já conversou comigo no primeiro dia. Quando o secretário de Segurança (José Mariano Beltrame) me convidou... Não entendo como convite. É uma missão. Sou um homem de operações especiais: missão dada é missão cumprida. O secretário tem ser o protagonista disso (reivindicar melhores salários) e ele já faz isso o tempo todo. Eu falei com o governador e ele disse que eles (os PMs) necessitam e merecem uma condição melhor. Ele me disse isso e eu acredito no governador. Agora, eu cheguei para trabalhar e a tropa está muito motivada. Diante de tanto trabalho a ser realizado, qual será o seu grande desafio? CORONEL MÁRIO SERGIO: Eu pretendo fazer muitas mudanças. Não são mudanças de minha cabeça, são de muitas cabeças. O grande desafio vai ser mudar a cultura da estrutura de poder dentro da PM. Desafio de transformar uma estrutura de poder em estrutura de serviços. Hoje temos o formato do Exército, com primeira, segunda, terceira seção, temos que desburocratizar. A PM tem uma crença de que antiguidade é posto. Isso é uma besteira. Já trabalhei com pessoas mais modernas (jovens) que eu. Agora, competência é posto. Muitos aqui também pensam assim. E como será essa desburocratização? CORONEL MÁRIO SERGIO: Todos vão ser testados na parte operacional, para assumir até mesmo serviços administrativos. Todos terão que passar pela capacidade de gerenciar grandes problemas e de suportar as dores, a dor de ter que sepultar companheiros e deter que ir ao encontro da população quando há morte de inocentes. Eu não sou o mais importante aqui, sou coadjuvante. Quem faz a polícia é quem tem contato com o público, o soldado. E por que o senhor nomeou duas mulheres para comandar batalhões. A sua mulher (major da PM) influenciou nessa decisão? CORONEL MÁRIO SERGIO: Vou colocar outras mulheres em postos de comando em poucas semanas. Mas isso não foi exatamente uma influência da minha mulher... Em breve, estarei tirando ela do Palácio Guanabara (onde ela está lotada) para uma função aqui. Devo colocá-la na assistência social porque lá há problemas urgentes. Vamos discutir os problemas mesmo em casa, na hora de lazer.