Título: Fazenda tem 4 nomes para assumir Receita
Autor: Beck, Martha ; Alvarez, Regina
Fonte: O Globo, 12/07/2009, Economia, p. 28

A cúpula do Ministério da Fazenda já tem uma lista de nomes para substituir a secretária da Receita Federal, Lina Vieira, demitida pelo ministro Guido Mantega, conforme informou Jorge Bastos Moreno em sua coluna no GLOBO na edição de ontem. Os mais cotados para o cargo são o subsecretário de Gestão Corporativa da Receita, Odilon Neves Jr.; o presidente do INSS, Valdir Simão; Paulo Ricardo Cardoso, ex-secretário-adjunto da Receita que é o atual diretor de gestão da Dívida Ativa na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN); e Carlos Alberto Barreto, ex-secretário-adjunto da Receita, que comanda o Conselho de Administração de Recursos Fiscais. Os nomes serão levados ao presidente Lula esta semana, quando a saída da secretária será formalizada. Os dois primeiros têm, em comum, uma forte ligação com o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado, que desde a saída de Jorge Rachid da Receita ampliou sua influência sobre a secretaria. Nos bastidores do Ministério da Fazenda, o próprio Machado é cogitado para assumir o comando da Receita, sendo que, nesse caso, acumularia as duas funções. A saída de Lina Vieira da Receita é o desfecho de uma crise que vinha se agravando nos últimos meses, com uma série de problemas que desgastaram sua imagem junto ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, incluindo o episódio envolvendo a Petrobras, considerado por integrantes da cúpula do governo a gota d'água do desgaste do ponto de vista político. Lina já estava como 'rainha da Inglaterra', diz fonte Em maio, o GLOBO revelou que a Petrobras conseguira, por meio de um artifício fiscal, compensar mais de R$4 bilhões em impostos devidos em 2008 e estava sendo investigada pela Receita Federal. Mesmo com a contestação da Petrobras, a Receita Federal divulgou nota, à época, reforçando que a legislação citada pela estatal não autorizava a operação de mudança de regime fiscal no meio do exercício de 2008. A manifestação da Receita ¿ que indiretamente indicava que a Petrobras cometera uma infração passível de multa, mesmo sem citar a empresa ¿ foi feita sem o conhecimento prévio do ministro da Fazenda, Guido Mantega, provocando grande constrangimento e desgaste à secretaria. A descoberta de que a Petrobras tinha usado um artifício para pagar menos impostos deu fôlego à criação de uma CPI no Senado para investigar as contas da estatal. Ontem, a Petrobras divulgou nota afirmando que não foi multada nem notificada pela Receita Federal. E reiterou sua posição sobre a compensação de impostos: "A adoção do regime de caixa para apuração de impostos sobre a variação cambial é perfeitamente legal e foi amparada pelo previsto na medida provisória 2.158-35/2001. O valor líquido de IRPJ e CSLL compensado pela Petrobras com outros tributos federais foi de R$1,14 bilhão e não R$4 bilhões. O valor que a empresa compensou, na verdade, já havia sido pago anteriormente, a mais". A saída de Lina Vieira da Receita Federal está também diretamente relacionada à queda de arrecadação verificada desde a sua posse e à resistência às mudanças internas promovidas pela secretária. Na prática, ela já estava afastada de decisões importantes de responsabilidade de sua supersecretaria. Quando assumiu o comando do Fisco, há pouco menos de um ano, Lina fez uma verdadeira dança das cadeiras e substituiu não apenas secretários-adjuntos, mas também superintendentes de quase todas as regiões fiscais. As mudanças provocaram insatisfação entre boa parte dos auditores. Como a categoria é fortemente sindicalizada, trocas de comando normalmente resultam na indicação de funcionários do mesmo grupo político para cargos importantes. O problema não seria grave, não fosse o atual momento, em que o governo precisa de uma Receita Federal bem equipada para combater a sonegação fiscal e recuperar a arrecadação, impactada pela crise econômica. O argumento dos adversários de Lina é que ela mudou tudo de uma vez, o que acabou deixando a Receita desarticulada num momento delicado. Além disso, a secretária é acusada de dar importância excessiva ao movimento sindical. ¿ Existem hoje mais de 200 servidores da Receita que estão liberados de seu trabalho para a prática sindical, como redigir atas e preparar reuniões de sindicato ¿ afirma um alto funcionário da Fazenda. Poucos meses depois de nomear Lina para a Receita, começaram a surgir no Ministério da Fazenda boatos de que Mantega estaria arrependido de tê-la escolhido para suceder Jorge Rachid. Aos poucos, Lina foi sendo afastada das decisões importantes da Receita, que passou a ser comandada, de fato, pelo secretário-executivo Nelson Machado. Tanto que, quando queria discutir assuntos técnicos, Machado chamava o auditor responsável pela área de interesse, sem qualquer participação de Lina. ¿ Ela estava como rainha da Inglaterra no comando da Receita Federal ¿ diz uma fonte da Fazenda. Unafisco prevê entrega de cargos por funcionários A saída de Lina não surpreendeu o empresariado paulista e foi até comemorada por alguns empresários. Lina é considerada autoritária e de difícil relacionamento com dirigentes do setor empresarial de São Paulo, responsável por mais de 30% do PIB brasileiro. ¿ A função de secretária da Receita é espinhosa, e o chefe não tem mesmo que ser bonzinho. Mas, no caso de Lina Vieira, 90% do empresariado paulista a consideram sem diálogo com o setor ¿ disse uma fonte ligada à direção da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). De acordo com essa fonte, o antecessor, Jorge Rachid, era o modelo preferido pelo empresariado. ¿ Rachid era durão, mas aberto ao diálogo. Sempre que surgia um problema, ele recebia os representantes empresariais, discutia as questões. No caso dessa senhora, é diferente. Ela não atende os empresários, não marca audiência, e, quando marca, a data fica para o fim do ano e nunca acontece ¿ explicou a fonte, acrescentando que empresários paulistas reclamaram inúmeras vezes ao ministro Mantega e ao presidente Lula. Entre sindicalistas, a reação à saída foi de indignação, segundo Vera Tereza Balieiro, representante do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil no Rio de Janeiro (Unafisco Rio). Ela disse que haverá um impacto muito grande no Fisco, com alguns funcionários entregando seus cargos em solidariedade à demissão de Lina. Vera Tereza acrescenta que ontem já havia recebido inúmeras ligações de funcionários: ¿ Acredito que pode haver processos públicos, com ações na Justiça. Desde que Lina iniciou sua gestão, ela passou a escolher as pessoas por mérito. Um dos marcos foi o foco em fiscalizar grandes contribuintes. Ela não permitiu que a Receita Federal fosse usada por forças políticas. É por isso que isso está acontecendo agora.

Leoa com estilo 'pé na porta'

Secretária teria 'aparelhado' Fisco e sofreu desgaste com Petrobras BRASÍLIA. O estilo da secretária Lina Vieira à frente da Receita Federal é definido por auditores fiscais como "pé na porta", o que teria contribuído para o seu desgaste interno. Num curto período, Lina desmontou toda a estrutura construída ao longo de anos. E teria "aparelhado" o órgão com a indicação de sindicalistas para postos-chave. Com um estilo consumista, a secretária envolveu-se em um episódio constrangedor já no exercício do cargo, que também teria arranhado sua imagem. Em viagem de trabalho a Foz de Iguaçu, Lina teria atravessado a fronteira com o Paraguai para fazer compras, segundo relatam funcionários da Receita. Em outras ocasiões, a secretária teria encomendado produtos a auditores em viagens de trabalho ao exterior, o que era visto como um comportamento impróprio dentro da Receita. Ex-secretária de Fazenda do Rio Grande do Norte e coordenadora do Confaz (conselho dos secretários estaduais de Fazenda), Lina chegou à Receita pelas mãos do secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado. Nos bastidores, funcionários que conhecem por dentro a estrutura do órgão identificam na sua indicação uma tentativa de Machado de manter o controle total da Receita Federal. A princípio, a secretária parecia ter um perfil dócil, que não reagiria a essa ingerência. O episódio da Petrobras revelou certa independência por parte de Lina, que desagradou aos seus chefes.