Título: O nó do clima
Autor:
Fonte: O Globo, 10/07/2009, Ciência, p. 31

Grandes poluidores não chegam a metas concretas contra o aquecimento global

ÁQUILA, Itália

Países ricos e em desenvolvimento não se entendem sobre o clima. O encontro entre os 17 maiores poluidores do mundo promovido ontem pela cúpula do G8, em Áquila, na Itália, terminou sem acordo ou consenso. Convocada pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, a reunião não desatou o nó das responsabilidades. Os países do G-8 concordaram em reduzir em 80% as suas emissões de gases causadores do efeito estufa até 2050, em relação aos níveis de 1990. Porém, vincularam isso a uma redução das emissões dos países emergentes em 50% no mesmo período.

Países emergentes, como China, Índia e Brasil, só aceitam fazer reduções se estas vierem acompanhadas de ajuda financeira dos países ricos, grandes responsáveis pelo aquecimento global. E o G-8 não apresentou qualquer medida concreta nesse sentido.

Além disso, o próprio G-8 demonstrou um racha entre os seus integrantes. Representantes do Canadá e da Rússia disseram que dificilmente vão poder honrar a meta de redução de 80% das emissões de gases causadores do efeito estufa.

Segundo o ministro do Meio Ambiente canadense, Jim Prentice, seu país pode reduzir as emissões entre 60% e 70% até 2050.

¿ O valor de 80% é uma aspiração coletiva.

Não significa que todos os integrantes do G-8 vão atingir exatamente essa meta

ONU e cientistas criticam inércia do G-8

Apesar do impasse, o presidente dos Estados Unidos disse, durante um encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ainda acredita num acordo até o fim do ano, quando acontecerá a reunião de cúpula da ONU sobre o clima, na Dinamarca, na qual o mundo vai buscar um acordo para suceder o Protocolo de Kioto, que expira em 2012.

Segundo relatos da conversa reservada entre os dois líderes, Obama disse a Lula que ainda há tempo para que as divergências entre os países ricos e em desenvolvimento sejam resolvidas antes da reunião de Copenhague.

Para Obama, Brasil e EUA têm condições de liderar as discussões e a busca por uma alternativa que permita ao mundo chegar a um acordo para conter o aquecimento global.

As ambições de Obama, porém, podem encontrar um obstáculo em seu próprio país.

Em Washington, uma comissão especial para as questões climáticas suspendeu seus trabalhos até o fim do recesso do Congresso americano, em setembro, aumentando as dúvidas sobre a capacidade de o presidente americano chegar a Copenhague com uma proposta concreta sobre redução de emissões.

Para o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, a reunião do G-8 não apresentou avanços suficientes na questão climática.

¿ Essa é uma questão imperativa, politicamente e moralmente, e de responsabilidade histórica para o futuro da Humanidade.

Analistas acreditam que só restam dois eventos em que esses impasses poderão ser solucionados antes de Copenhague: um encontro na sede da ONU, em Nova York, e uma reunião do G-20 em Pittsburgh, ambos em setembro.

Ontem, um comunicado escrito por 25 cientistas eminentes ¿ entre eles, o vencedor do prêmio Nobel de Química Mario Molina, descobridor do buraco de ozônio ¿ cobrou dos integrantes do G-8 medidas concretas contra o aquecimento global e ações imediatas para a transição rumo a uma economia menos poluente.

¿Ainda temos uma pequena janela de oportunidades para agirmos, mas ela vai se fechar em breve¿, disseram os cientistas.

No Brasil, o Greenpeace emitiu um comunicado no qual critica a posição do presidente brasileiro em Áquila. A ONG afirma que os integrantes do G-5 seguiram o caminho de seus colegas do G-8, e optaram por abdicar do papel de liderar o enfrentamento da crise climática.

¿Ao não se comprometerem com metas de redução e com números para encarar a crise do clima, os governantes dos países em desenvolvimento, incluindo o presidente brasileiro, mostram que preferem virar parte do problema, em vez da solução.

COLABOROU: Deborah Berlinck, enviada especial a Áquila