Título: Três temas para a recuperação
Autor: Palocci , Antônio
Fonte: O Globo, 19/07/2009, Opinião, p. 7

Com um período já relativamente longo de ausência de surpresas negativas, as perspectivas para a economia mundial parecem começar a permitir projeções mais críveis. Vale notar que praticamente todas as previsões para o cenário econômico global das agências multilaterais interromperam um longo ciclo de revisões para baixo e iniciaram o caminho inverso.

Não há, a bem da verdade, muita segurança sobre o futuro. Mas a ausência de notícias gravemente negativas nos últimos meses é um alento.

Ainda existem dúvidas sobre o mercado americano de cartões de crédito, sobre os preços do mercado imobiliário não residencial e sobre o balanço de pagamentos dos países do Leste Europeu e suas intrincadas relações com o sistema bancário da Zona do Euro, entre outras coisas.

Há dúvidas também sobre a natureza dos sinais positivos que começam a aparecer nas maiores economias.

Muitos analistas suspeitam que tais sinais sejam exclusivamente dependentes dos estímulos fiscais recentes, com pouco significado em termos de recuperação real do tecido econômico. Algo como se a ¿mão invisível dos mercados¿, de Adam Smith, tivesse tirado longas férias.

É isso que dá lugar, ainda, a diferentes avaliações sobre a necessidade de novos pacotes de estímulo ¿ sustentada, por exemplo, pelo diretorgerente do Fundo Monetário Int e r n a c i o n a l ( F M I ) , D o m i n i q u e Strauss-Kahn, mas sem repercussão na reunião de L¿Aquila do G8 + 5.

No campo das preocupações sobre os pilares de sustentação de um novo ciclo econômico, há alguns temas de consenso e outros de dúvidas. O consenso vem da necessidade de construir um novo sistema de regulação financeira, tanto no âmbito dos diferentes países quanto no ambiente global.

Igualmente, há acordo sobre a necessidade de deter os impulsos protecionistas, inevitáveis em momentos de recessão e crescimento do desemprego.

Os dados do Banco Mundial indicam que nada menos do que 16 dos 19 países do G-20 tomaram medidas de restrição de comércio ou proteção setorial no último período.

Por isso, os líderes do G8 + 5 agora reforçam a necessidade da retomada de uma nova rodada de negociações para a liberalização do comércio. A dificuldade, nesse campo, está na distância entre a disposição declarada dos líderes e as negociações de fato, que pouco tem avançado.

Mas a dúvida maior é o quanto o tema das mudanças climáticas deveria participar da agenda da recuperação.

Em geral, a maioria dos líderes globais, embora mostre um compromisso crescente com o tema ¿ como é o caso mais evidente do governo americano ¿, parece temer que as obrigações decorrentes de metas de corte de emissões de gases de efeito estufa seriam, na verdade, um freio e não um incentivo a um processo de recuperação econômica.

De fato, não há como buscar uma economia menos dependente de carbono sem custos. Por outro lado, se as medidas em direção às fontes renováveis de energia contarem com instrumentos mais eficientes, a busca por uma economia mais limpa pode gerar novos investimentos. E, ainda, outros esforços de pesquisa e inovação e novas iniciativas no campo social, como o pagamento por serviços ambientais ¿ todos eles capazes de dar uma sustentabilidade maior a um novo ciclo de crescimento.

Recentemente, o presidente Lula e o ministro Carlos Minc enviaram ao Congresso Nacional legislação que institui um fundo e um sistema de pagamentos por prestação de serviços ambientais. É uma lei inovadora e uma resposta eficiente ao grande desafio de preservação de reservas naturais e de seu uso sustentável. O pagamento por serviços ambientais é um debate feito em todo o mundo, mas com poucas experiências em andamento. O Brasil dará uma nova contribuição à questão se conseguir implantar um bom programa nessa área.

Compreendidos desta forma, mecanismos de baixo carbono podem ser instrumentos de incentivo a um novo ciclo, e não o contrário. Principalmente, se estamos, de fato, em busca de um novo ciclo de crescimento mais sustentável e mais duradouro do que os últimos.

ANTÔNIO PALOCCI é deputado federal (PTSP) e foi ministro da Fazenda.