Título: É assistencialismo? Pode ser
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 17/07/2009, O País, p. 3

Ao defender Bolsa Família, Lula compara: "Posso dar R$50 de gorjeta num boteco"

Em discurso ontem na abertura do 51º Congresso Nacional da União Nacional dos Estudantes (UNE), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu, pela primeira vez, o caráter assistencialista do programa Bolsa Família. Mas defendeu os programas sociais de seu governo, como o Bolsa Família e o Universidade para Todos (ProUni), que repassa verbas a universidades particulares em troca de vagas para estudantes pobres. E lembrou da época do lançamento do Bolsa Família, em 2004:

- De vez em quando, nós temos adversários. Eu me lembro que, quando criamos o Bolsa Família, alguém falava: "Isso é populismo, isso é assistencialismo". Pode ser, porque no fundo, no fundo, não passa de dar assistência a uma pessoa. Agora, para mim, que posso tomar cerveja em um boteco e dar R$50 de gorjeta, isso não tem nenhum valor.

O presidente completou:

- Imaginem uma mãe pobre que dizia assim: "Eu, antes do Bolsa Família, comprava um lápis e partia no meio para dar metade para cada neto". E ela dizia: "Hoje eu compro uma caixa para cada neto". Ora, quem nasceu sem precisar disso não sente.

Sobre o ProUni, Lula afirmou que, à época do lançamento, houve quem dissesse que o governo estaria popularizando demais a universidade e repassando recursos públicos para entidades privadas. Ao contar a história de uma mulher na Bahia cuja casa não tinha luz elétrica, o presidente se emocionou, e chegou a ficar com os olhos marejados. Mãe solteira, segundo Lula, ela morava com o filho e a mãe. Quando o programa Luz para Todos chegou à sua casa, a mulher, agradecida, disse a Lula que era a primeira vez que via seu filho dormindo à noite. Com a voz embargada, Lula parou de falar e tomou um copo de água.

Particulares: culpa de outros governos

Recebido por estudantes com um coro de "Lula, guerreiro do povo brasileiro", o presidente disse que sempre defendeu que a UNE também representasse estudantes de universidades particulares, e afirmou que a culpa do excesso de faculdades particulares é de governos anteriores.

- Não era culpa de ninguém, a não ser de sucessivos governos que, ao longo dos anos, priorizaram a irresponsabilidade com a educação para que ela fosse privatizada. Não é à toa que o estado mais rico da federação tem 82% dos universitários em escolas particulares - criticou Lula, sem citar nomes.

Antes de discursar, o presidente brincou com os estudantes que não paravam de gritar seu nome:

- Vocês vieram aqui para trabalhar ou para gritar?

Lula defendeu a UNE dos que a criticam pelo adesismo ao governo. Para ele, o fato de a entidade negociar com o governo, e ter seu apoio, não significa que não tenha senso crítico:

- Houve um tempo em que algumas pessoas não encostavam perto de quem estava no governo, com medo de que aquilo pudesse parecer que ele seria cooptado.

A plateia, antes da chegada de Lula, dividia-se entre pré-candidatos a presidente. De um lado, um coro puxava "Olê, olê, olê, olá, Dilma, Dilma". Outro grupo, menor, entoava: "Brasil, urgente, Ciro presidente".

O reajuste dos benefícios do Bolsa Família foi discutido por Lula anteontem com os ministros Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), Dilma Rousseff (Casa Civil) e Paulo Bernardo (Planejamento). Lula já tomou a decisão política de corrigir os benefícios do programa neste e no próximo ano, mas ainda não estabeleceu o percentual nem os critérios. A ideia do governo é criar uma regra permanente de reajuste do programa para minimizar os ataques da oposição de que a decisão é eleitoreira.