Título: Empresas teriam inflado compensação tributária
Autor: Beck, Martha; Novo, Aguinaldo
Fonte: O Globo, 17/07/2009, Economia, p. 23

Mecanismo aumentou 40% no 1º tri. Câmbio e escassez de crédito levou a corrida ao Fisco

BRASÍLIA. Um dos fatores que influenciou a queda na arrecadação tributária este ano foi o elevado montante de desonerações fiscais (R$13 bilhões). Apenas no primeiro trimestre, essas compensações tiveram salto de 40%. Essa alta foi impulsionada pela solicitação de valores muito elevados por companhias de grande porte com negócios no exterior, afirmou ao GLOBO uma fonte da Receita Federal. Assim como a Petrobras, que conseguiu obter mais de R$4 bilhões em créditos decorrentes de variações cambiais, outras companhias exportadoras, importadoras e com participação estrangeira tiveram suas atividades influenciadas pelo comportamento do dólar.

E, segundo investigações dos técnicos da Receita, essa conjuntura incentivou uma corrida ao Fisco. Nos três primeiros meses de 2009, as compensações foram de R$12 bilhões. Até agora, no entanto, a Receita ainda não identificou se outras empresas fizeram mudanças em seu regime tributário para obter mais compensações - procedimento adotado pela Petrobras, que gerou uma investigação da Receita, num episódio apontado como a gota d"água para a demissão de Lina Vieira.

A Receita Federal mantém sigilo sobre a situação fiscal dos contribuintes e investigações. Mas a presença no exterior, característica comum ao grupo de empresas sob fiscalização, permite traçar um perfil dos alvos. Na lista das maiores exportadoras e importadoras do Brasil estão empresas com participação de estrangeiros e que atuam em cinco setores predominantemente: petróleo e petroquímica, mineração, alimentos e commodities alimentícias, automobilístico e eletroeletrônicos.

- O câmbio foi um dos fatores que mais influenciaram as compensações. Empresas com capital estrangeiro, por exemplo, tiveram variação patrimonial que reduziu seus lucros - explicou um técnico da Fazenda.

Ele garante que não há um setor econômico que predomine na lista das empresas que fizeram mais compensações, mas afirma que elas são, em geral, de grande porte. Num caso, uma empresa que tinha um histórico de compensações em torno de R$15 a R$20 milhões utilizou este ano créditos de R$100 milhões.

50% das compensações, em média, são irregulares

Outro fator que pode ter influenciado esse movimento, segundo fontes do Fisco, foi a falta de crédito. Como houve uma retração oferta de financiamentos no auge da crise financeira, a maior desconfiança dos fiscais é que as empresas podem ter feito compensações tributárias fictícias para levantar capital de giro.

Como a Receita leva até cinco anos para analisar uma compensação tributária, isso daria ao contribuinte tempo para resolver seu problema de escassez de crédito. Se ele tiver que pagar tributos posteriormente, o valor será corrigido pela taxa básica de juros Selic, que está em queda, além de uma multa de 1% ao mês.

A utilização de créditos tributários fictícios não é incomum. Um levantamento feito pela Receita já mostrou que, em média, 50% das compensações feitas são irregulares. Por isso mesmo, o Fisco já começou a analisar com lupa as contas das empresas que usaram esse tipo de instrumento este ano. (Martha Beck)