Título: Retorno de Zelaya ameaça as negociações
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Fonte: O Globo, 18/07/2009, O Mundo, p. 27

LA PAZ e TEGUCIGALPA. O presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, pode já estar de volta a seu país, declarou ontem o presidente venezuelano, Hugo Chávez, ameaçando colocar em risco a segunda rodada de negociações, marcada para hoje, na Costa Rica. Chávez afirmou, ainda, que o governo que assumiu o poder após o golpe de 28 de junho teria fechado todas as estradas entre Honduras e os países vizinhos, para tentar evitar a entrada de Zelaya, enquanto em Tegucigalpa os golpistas se diziam dispostos a repelir qualquer intervenção estrangeira.

Na véspera, a chanceler do governo deposto, Patricia Rodas, afirmara que Zelaya estava a caminho de Honduras. Na Bolívia, Chávez reforçou ontem a afirmação, primeiro dizendo que o presidente deposto "regressaria nas próximas horas" e que pretendia apoiá-lo. Três horas depois, voltou ao assunto:

- Não sei se a esta hora Zelaya já está em território hondurenho. Não sei se Zelaya vai aparecer publicamente em alguma cidade de Honduras numa passeata ou se ficará clandestino.

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Sem se referir diretamente a Chávez, a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, pediu a todos os países que "joguem um papel positivo" para resolver a crise e evitem "ações que possam resultar em violência". Uma fonte do Departamento de Estado foi mais clara, dizendo que os EUA estão preocupados com a volta de Zelaya e que a retórica de Chávez não ajuda.

O clima é de tensão crescente, inclusive com países vizinhos. O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, afirmou que Honduras reforçou a fronteira, inclusive com artilharia antiaérea. As Forças Armadas, que destituíram Zelaya, desmentiram a mobilização de tropas. Já Roberto Micheletti, que assumiu o poder após o golpe, afirmou que há estrangeiros infiltrados no país para cometer atos de guerrilha e que 56 nicaraguenses já foram presos.

- Estamos certos de que o apoio estrangeiro (a Zelaya) já está dentro do país - disse.

Enquanto isso, manifestantes voltaram a bloquear estradas de acesso a Tegucigalpa pelo segundo dia. O trânsito nas fronteiras com El Salvador e Guatemala também foi interrompido. Por sua vez, a Federação Internacional de Trabalhadores de Transportes pediu ontem que seus 4,5 milhões de membros boicotem navios de bandeira hondurenha em protesto contra o golpe.

Uma tentativa de volta de Zelaya - a segunda desde que foi deposto - pode atropelar as negociações. O mediador e presidente da Costa Rica, Oscar Arias, propôs um governo de unidade nacional. Mas tanto Zelaya quanto a comunidade internacional defendem a volta do presidente deposto, algo que os golpistas não aceitam. Micheletti estaria disposto a aceitar uma terceira pessoa na Presidência.

Honduras foi tema de uma conversa telefônica ontem entre o chanceler Celso Amorim e Hillary Clinton, que estava em Nova Délhi. Amorim está preocupado com o andamento da negociação. Segundo fontes, ele pediu apoio a Hillary para que seja encontrado "um novo rumo para a negociação". Na visão do ministro, não pode haver intermediação que não leve em conta o retorno de Zelaya. A ideia de um novo governo composto por Zelaya e integrantes do grupo de Micheletti é rechaçada pelo governo brasileiro. A avaliação é que isso seria um prêmio aos golpistas.

COLABOROU Eliane Oliveira, de Brasília