Título: Passagens: Câmara deve investigar 4 deputados
Autor: Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 24/07/2009, O País, p. 10

Casa abre processos administrativos contra 44 servidores suspeitos de envolvimento com máfia dos bilhetes

BRASÍLIA. A Câmara vai investigar o suposto envolvimento de pelo menos quatro deputados no mercado paralelo de venda de passagens aéreas da cota parlamentar. O relatório da comissão de sindicância administrativa foi entregue ontem ao presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), que o encaminhou à Corregedoria Geral da Casa devido a referências a deputados.

Além disso, abriu 44 processos administrativos contra funcionários da Casa sobre os quais há indícios de participação na máfia das passagens.

O corregedor da Casa, Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA), afirmou que dará celeridade às investigações e que nada ficará sem resposta. A Casa está em recesso, e os trabalhos serão retomados no dia 3.

¿ Se ficar comprovado que algum deputado vendeu passagens de sua cota, entendo que isso se configura quebra de decoro parlamentar e vou defender a abertura do processo ¿ disse o corregedor.

Temer também enviará cópia do trabalho ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Ministério Público Federal. Durante 90 dias, uma comissão de sindicância formada por três servidores públicos da Casa investigou denúncias e colheu depoimentos de funcionários de gabinetes parlamentares, responsáveis por agências de turismo e passageiros vítimas do esquema.

Não foram ouvidos deputados.

A comissão foi criada em meio ao escândalo das farras de passagens aéreas e depois que dois ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) foram listados como usuários da cota parlamentar.

O presidente do STF, Gilmar Mendes, e o ministro Eros Grau apareciam como beneficiários das cotas dos deputados Paulo Roberto (PTB-RS) e Fernando de Fabinho (DEMBA), respectivamente. Os dois ministros negaram o uso da cota e apresentaram comprovantes de pagamento da compra.

Temer alegou recomendação jurídica para não divulgar texto O trabalho da comissão se baseou na denúncia dos ministros e de deputados que negaram ter cedido a cota a terceiros que constavam em lista divulgada pelo site Congresso em Foco, entre eles Nazareno Fonteles (PT-PI), Otávio Leite (PSDB-RJ), Vieira da Cunha (PDT-RS), Nelson Marquezelli (PTB-SP) e João Bacelar (PR-BA).

Um dos casos identificados pela comissão é o da ex-funcionária do gabinete de Fonteles, Rosimere Gomes da Silva. Ela confessou que vendia as passagens para agências de turismo.

Fonteles demitiu a funcionária em 24 de abril deste ano. A comissão encontrou e-mails que comprovam a negociação das passagens com uma agência.

Rosimere tinha a senha do deputado e chegou a repassá-la a funcionários da agência.

Dos funcionários ouvidos, 90% assumiram a responsabilidade pela venda irregular das passagens, inocentando os deputados, mas houve quem acusasse parlamentares.

Sem poder de quebrar sigilo, a comissão constatou o esquema fraudulento de uso da cota identificando vários operadores do sistema.

A conclusão da sindicância tem mais de 100 páginas, além dos autos. O trabalho foi concluído às 3h45 da madrugada de quarta para quinta-feira, e entregue ontem a Temer. Segundo a assessoria da Câmara, Temer acatou recomendação jurídica para não dar publicidade ao relatório. O argumento é o de que na comissão de sindicância não foi dado amplo direito de defesa aos investigados.