Título: TJ censura notícias sobre Fernando Sarney em jornal
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Fonte: O Globo, 01/08/2009, O País, p. 13

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS: OAB diz que decisão é lamentável e que censura prévia acabou em 1988

Desembargador alega segredo de Justiça em inquérito da Polícia Federal; "O Estado de S.Paulo" vai recorrer

BRASÍLIA. O desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, proibiu ontem o jornal "O Estado de S. Paulo" de publicar qualquer informação que esteja sob segredo de Justiça no inquérito que investiga Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Em caráter liminar, o desembargador estipulou multa de R$150 mil para cada reportagem do jornal contrária à decisão. Como o caso é sigiloso, o tribunal não divulgou o teor do despacho com os argumentos do magistrado.

A liminar foi concedida a pedido da defesa de Fernando Sarney. Os advogados alegaram que o vazamento de informações sigilosas das investigações poderia causar "prejuízo incalculável à honra" do cliente. O jornal informou que vai recorrer da decisão.

No dia 22 de julho, o jornal publicou reportagem com o teor dos diálogos gravados durante operação da Polícia Federal que investiga desvios de recursos e caixa dois em campanha. As conversas mostram Fernando Sarney negociando com o pai a nomeação de parentes para cargos no Senado.

Em nota divulgada ontem, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, lembrou que a censura prévia acabou formalmente com a Constituição de 1988. "Se alguém se sente prejudicado com o conteúdo de matéria jornalística, a medida adequada deve ser a de processar civil e criminalmente o responsável, mas jamais qualquer pessoa tem o direito de retirar a expressão do seu pensamento". Para Britto, a decisão do desembargador é "lamentável", pois restaura a censura prévia no país, "somente utilizada no triste período do regime militar".

A primeira confusão em torno da operação teve início em agosto de 2008, quando a Polícia Federal e o Ministério Público Federal pediram a prisão de Fernando Sarney e mais 14 pessoas acusadas de lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e outros crimes. A Justiça Federal negou os pedidos de prisão e de busca e apreensão em endereços dos investigados. Nesse período, surgiram informações de que Fernando Sarney teria sido alertado sobre os pedidos de prisão e de busca, o que teria atrapalhado as investigações.

Na etapa seguinte, surgiram os primeiros vazamentos de dados sigilosos da operação. Depois, o "Jornal Pequeno", jornal local de São Luís, divulgou trechos das investigações, inclusive de conversas de Fernando Sarney com seus sócios. A polícia reclamou do vazamento no período. O caso ganhou novos contornos com a crise em torno de Sarney, no Senado.