Título: Tanque cheio com dinheiro público
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 08/03/2009, Política, p. 5

Parlamentares que são donos de postos de gasolina usam verba indenizatória para abastecer em seus próprios estabelecimentos

Para Ivan Valente, do PSol, Câmara deve investigar todas as notas fiscais No mundo secreto das notas fiscais apresentadas pelos deputados desde 2001 para comprovação de gastos com a verba indenizatória circulam dúvidas sobre o destino de parte dos recursos, que muitas vezes foram parar nas empresas dos próprios parlamentares. Um desses casos é o uso do dinheiro público para abastecer veículos nos postos de combustíveis de propriedade dos deputados. Pelo menos 11 integrantes da Câmara possuem esse tipo de comércio e alguns até admitem que utilizam a própria empresa como fornecedora. ¿Às vezes, quando passo pelo meu posto, que fica no sul de Minas, abasteço lá. Estranho seria que em uma cidade pequena eu escolhesse o concorrente. Isso não é proibido¿, comenta o mineiro Mauro Lopes (PMDB).

O deputado tem razão. Proibido não é. O que alguns ¿ poucos ¿ políticos ressalvam é a dificuldade de fiscalização em torno da prestação do serviço. Com a facilidade de entregar e apresentar as notas fiscais da própria empresa, fica praticamente impossível para a Câmara saber se o dinheiro repassado foi realmente destinado ao pagamento de uma atividade realizada. ¿É aí que entra a necessidade de tornar as prestações de contas e as notas públicas desde que a verba indenizatória foi criada. É absurdo usar dinheiro público para um serviço da própria empresa. Pior ainda é a falta e a dificuldade de realizar uma fiscalização ampla sobre a execução do trabalho¿, opina o líder do PSol na Câmara, Ivan Valente (SP).

A árdua tarefa de investigar se a prestação dos serviços foi concretizada cabe ao primeiro secretário da Casa, Rafael Guerra (PSDB-MG), que admite a dificuldade de mapear possíveis irregularidades. ¿Essa é uma dúvida que vai sempre rondar as notas e o uso da verba. Não há como averiguar se os serviços foram prestados. Além disso, essa coisa de usar o serviço da própria empresa é estranho mesmo. Não há normas proibindo, mas é esquisito. Acho que essa polêmica só terá um fim quando acabarmos com a verba¿, diz.

O caixa dos postos Enquanto a Câmara não cria regras ou normas para evitar que o dinheiro público termine no caixa das empresas dos parlamentares ¿ ou que as notas sejam emitidas sem que os serviços sejam prestados ¿, alguns deputados seguem justificando os motivos pelos quais escolhem os próprios postos para abastecer os veículos. ¿Usoàs vezes porque meu posto está arrendado há mais de dois anos e não tenho mais relação direta com ele. É um posto pequeno, que até teve o nome mudado por quem arrendou. Abasteço uns R$ 600 por mês lá¿, afirma Edinho Bez (PMDB-SC).

¿Abasteço às vezes no meu posto porque ele é localizado na rodovia. Quando passo por lá, não tem motivos para abastecer no concorrente. Não há problema nisso. Apresento notas de vários outros postos¿, diz Mauro Lopes. Assessores de Antonio Andrade (PMDB-MG) afirmaram que o posto de propriedade do deputado é um dos poucos da região de Vazante, no interior do estado. O que deixaria o parlamentar sem muitas opções.

¿O que queria entender é por que o Edmar Macedo errou ao usar os recursos da verba para as empresas de segurança que estão em seu nome, mas ninguém faz alarde quando se usa a gasolina dos postos dos quais são proprietários. Quer dizer que dono de gráfica pode imprimir material na sua empresa, dono de empresa de publicidade pode contratar os serviços dos seus funcionários? ¿, questiona Ivan Valente.