Título: Cultura: ministro admite falha no combate a fraudes
Autor: Duarte, Alecssandra; Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 03/08/2009, O País, p. 5

Empresas envolvidas com venda de notas fiscais aprovaram projetos pela Lei Rouanet e captam recursos no mercado

RIO e BRASÍLIA. O ministro da Cultura, Juca Ferreira, informou que pretende criar um cadastro para registrar empresas e entidades proponentes de projetos culturais favorecidos pela Lei Rouanet. O objetivo é corrigir as falhas que admitiu existir no acompanhamento dos processos de aprovação dos projetos culturais beneficiados por isenção fiscal. Em reportagem publicada ontem, O GLOBO mostrou que empresas envolvidas na venda de notas fiscais no mercado cultural conseguiram aprovar quase R$14 milhões em projetos pela Lei Rouanet.

- Vamos criar um cadastro para que quem pise na bola, cometa alguma irregularidade, não possa propor mais (projetos). Já fazemos isso hoje, mas precariamente - disse Juca, que pretende incluir as mudanças na proposta de reforma da Lei Rouanet, que será enviada ao Congresso nos próximos dias.

Do total de 13 empresas emissoras de "notas de favor" (notas fiscais compradas por prestadores de serviços da área cultural para escapar da tributação regular), sete receberam carta branca do Ministério da Cultura para captar recursos pela Lei Rouanet - politica de incentivos fiscais que possibilita a empresas e cidadãos aplicar parte do imposto em ações culturais.

O cadastro do Ministério da Cultura informa que, das sete empresas com projetos aprovados, três (Guanumbi, Fênix e Rigel) estão autorizadas até o fim do ano a buscar recursos no mercado. A Guanumbi, cuja sede fica em Jacarepaguá, em residência onde os moradores nunca ouviram falar da empresa, tem até 31 de dezembro para captar parcela dos R$782.222,50 aprovados para o projeto "Rosemary homenageia mulheres da Mangueira". Até agora, foram captados R$242 mil.

A Fênix é a empresa com mais projetos em aberto: seis, todos musicais, que somam quase R$2 milhões. Já a Rigel, que funciona no mesmo endereço da Fênix e outras quatro empresas, na Ilha do Governador, pode captar até dezembro R$281 mil do projeto "Sarau no Parque".

As três empresas são conhecidas por vender notas a artistas, produtores culturais, autores e outros prestadores de serviços na área cultural. Assim, os artistas evitam pagar impostos mais elevados como pessoa física ou jurídica. O esquema veio à tona com a descoberta do repasse de R$12,4 milhões da Petrobras para as empresas.

Especialistas na área tributária afirmaram que as partes envolvidas no mercado de notas fiscais estão agindo irregularmente. De acordo com a lei 8.137, de 1990 (que trata dos crimes contra a ordem tributária), é proibido "elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato".

Na semana passada, em debate no Rio, o ministro Juca Ferreira disse que, além de analisar a capacidade de execução do projeto que propõe, a Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (Cnic), responsável pela análise e aprovação dos projetos, também precisa melhorar a fiscalização quanto à idoneidade dos proponentes. Ele reconheceu que os processos de prestação de contas do MinC ainda são muito demorados:

- Hoje, todo o ônus e os custos dos procedimentos de prestação de contas são nossos, enquanto na área ambiental, por exemplo, quem paga pelo EIA-Rima são os proponentes. Aqui, o MinC, de orçamento baixo, é que arca com os custos de todo o processo de prestação de contas. Estamos estudando como mudar e modernizar isso.

O ministro quer, ainda, derrubar a exigência de que o proponente de projetos tenha finalidade cultural, por considerar a medida "hipócrita". Ele defendeu, por exemplo, que até associações de moradores possam apresentar projetos.

COLABOROU: Martha Beck