Título: Queda recorde na indústria brasileira
Autor: Melo, Liana; Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 04/08/2009, Economia, p. 19

Setor registra o pior 1º semestre em 34 anos, mas economistas já veem lenta recuperação

Foi um tombo histórico, que não se via desde 1975, quando o IBGE começou a fazer sua série histórica de indicadores da indústria. A produção industrial brasileira despencou 13,4% entre janeiro e junho deste ano, no pior primeiro semestre em 34 anos. Foi uma queda maior do que a registrada até mesmo em 1991 (quando o país mergulhou numa recessão com o confisco do presidente Fernando Collor) ou em 1980, após o segundo choque do petróleo de 1979.

Ainda assim, a indústria cresceu 0,2% em junho passado, na comparação com maio, já descontados efeitos sazonais, e analistas veem sinais de uma gradual recuperação.

No primeiro semestre, porém, dos 27 setores pesquisados, 24 registraram recuo e nem mesmo os segmentos beneficiados com medidas anticrise conseguiram evitar números negativos. Os únicos três setores da indústria que registraram expansão no primeiro semestre foram farmacêutico (10,3%), equipamentos de transporte (14%) e bebidas (5,2%).

Apesar da redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), a produção de veículos caiu, nos primeiros seis meses do ano, 23,6%, no pior resultado do setor para um primeiro semestre desde 1991.

E, segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), as vendas de automóveis caíram 4,92% em julho, na comparação com junho, para 285.406 unidades.

No ano, porém, as vendas registram alta de 2,34%.

Fundo do poço ficou para trás, diz analista

Dados da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) ¿ setor também beneficiado pela redução do IPI ¿ indicam uma queda de 19,4% no faturamento no primeiro semestre, para R$ 29,31 bilhões. As exportações no setor recuaram 29,2%, para US$ 3,797 bilhões. E o consumo interno caiu 6,3%.

Mas, segundo o IBGE, a produção industrial vem dando sinais de melhora e recuperando parte das perdas do último trimestre de 2008, quando o país foi atingido pela crise global.

Considerando o crescimento mês a mês (ou seja, na série com ajuste sazonal), a indústria acumula expansão de 7,9% entre dezembro de 2008 e junho. Trata-se de uma taxa, porém, ainda longe de zerar a perda de 20% registrada no fim do ano passado. A retomada, ainda que lenta, sinaliza uma reação da produção industrial, na avaliação de Isabella Nunes, no IBGE.

¿ É natural que, depois de taxas anteriores, que foram de crescimento forte, ocorra uma acomodação ¿ analisa Isabella, referindo-se ao fato de, em junho último, a indústria ter registrado crescimento de 0,2%, inferior portanto ao 1,2% de maio.

A retomada da indústria vem sendo liderada pelo segmento de bens de capital o que, para João Saboia, do Instituto de Economia da UFRJ, é sinal de confiança dos empresários. Em junho, esse segmento ¿ que produz máquinas e equipamentos para outros setores da indústria e, por isso, é um termômetro dos investimentos da economia ¿ cresceu 2,1% frente a maio.

¿ O fundo do poço está ficando para trás ¿ avalia Sabóia.

Mesmo concordando com Saboia que a indústria está retomando uma trajetória de crescimento, Ariadne Vitoriano, da Tendências Consultoria, não acredita que o país consiga chegar ao fim do ano registrando um taxa positiva. Ao contrário. Pelas suas projeções, a produção industrial deverá fechar 2009 com uma queda de 8,7%.

O presidente do Sindicato da Construção Civil do Rio (SindusconRio), Roberto Kauffmann, está confiante e aposta em números positivos para os próximos meses, ainda que o setor tenha registrado retração de 9,5% na produção de insumos para a construção civil ante junho de 2008.

Assim como automóveis e máquinas e equipamentos, alguns materiais de construção tiveram redução de IPI.

Kauffmann prevê que o setor tenha expansão entre 3% e 5% este ano.

¿ O setor tem potencial para crescer, especialmente com investimentos em infraestrutura, obras públicas e programas do governo ¿ disse Kauffmann.

Apesar do tombo da indústria, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, está convencido de que o país saiu da recessão.

Ontem, Meirelles afirmou que a economia brasileira já apresenta sinais claros de ter crescido no segundo e terceiro trimestres do ano.

Exportações recuam 10,7% em julho

Com peso de 24% no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos pelo país) a indústria foi a atividade econômica mais afetada pela crise internacional, porque é muito influenciada pelo comportamento das exportações e da oferta de crédito.

Ontem, o Ministério do Desenvolvimento informou que as exportações brasileiras caíram 10,7% em julho, frente a junho, totalizando US$ 14,143 bilhões. As importações, por sua vez, cresceram 4%, para US$ 11,215 bilhões, resultando num superávit comercial de US$ 2,928 bilhões.

Para o diretor de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roberto Giannetti da Fonseca, a valorização contínua do real frente ao dólar deve fazer com que os exportadores ¿ cujas vendas desabaram 30,8% em julho na comparação com o mesmo mês de 2008 ¿ percam rentabilidade este ano em reais. Levando em conta uma estimativa de exportações para este ano em torno de US$ 160 bilhões, ele acredita que o prejuízo será de cerca de R$ 48 bilhões.

Ele criticou o BC. Disse que hoje, no governo, não há ninguém que se responsabilize pela ¿estabilidade cambial¿, agindo para evitar oscilações e movimentos especulativos: ¿ O Banco Central não cumpre este papel.

COLABORARAM Lino Rodrigues, Eliane Oliveira e Eduardo Rodrigues