Título: PF relata partilha de dinheiro no Maranhão
Autor: Garrone, Raimundo
Fonte: O Globo, 20/07/2009, O País, p. 4

Segundo investigação, filho de Sarney comandava divisão de valores sobre contratos feitos com o governo

Raimundo Garrone*

SÃO LUÍS. Acusado pela Polícia Federal de chefiar uma organização que tem "atuado como um câncer na estrutura do poder público", Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), era quem determinava a partilha dos recursos recebidos, segundo relatório da PF e do Ministério Público que levou ao indiciamento, semana passada, do empresário, de sua mulher, Teresa Murad Sarney, e de outros empresários e sócios. No documento, de 2008, Fernando é acusado de usar seu motorista, Marco Bogéa, para "realizar pagamentos de suposta propina para a "equipe"". Ele nega as acusações.

De acordo com a PF, a equipe chefiada por Fernando Sarney é formada por Silas Rondeau, ex-ministro e integrante do Conselho administrativo da Petrobras; Astrogildo Quental, diretor financeiro da Eletrobrás; Ulisses Assad, diretor de engenharia da Valec; e mais dois antigos companheiros da turma de 78 da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), Gianfranco Perasso e Flávio Barbosa Lima, donos das empresas "onde é canalizado o valor oriundo dos desvios de dinheiro obtidos pela organização criminosa".

Numa das escutas telefônicas registradas no relatório do Ministério Público Federal, Fernando dá ordens a Gianfranco e Flávio Barbosa. Ele pede que os dois dividam os recursos recebidos e repassem parte para Silas, Astrogildo, Ulisses e familiares. No dia 6 de março de 2008, Fernando manda Gianfranco subtrair um sexto (valor e origem não determinados no relatório), dos quais 20% seriam destinados para Teresa Murad Sarney.

O grupo não perdoava os atrasos nos repasses que outras empresas favorecidas pelo esquema eram obrigadas a fazer para as companhias dirigidas por Gianfranco e Flávio Lima, segundo gravações da PF.

Num dos grampos, o representante da EIT Empresa Industrial e Técnica S.A, Romildo Teles, tenta acalmar um incontrolável Flávio Lima diante do atraso de mais de seis meses do repasse que a EIT deveria fazer após receber parcela dos recursos por obra em trecho da Ferrovia Norte-Sul.

No mesmo diálogo, Flávio Lima, além de ameaçar não dar um outro trecho da Norte-sul, diz que vai contar tudo para Silas Rondeau, que daria o troco merecido pela EIT.

Flávio avisa que vai falar com Silas e ainda avisa que vai se encontrar com Fernando:

- Eu vou encontrar com o Fernando agora ao meio-dia, eu vou falar para ele!

Depois das ameaças, o "débito" de R$130 mil teria sido pago à empreiteira, que sofre diversos processos judiciais, além de ter sido condenada pelo Tribunal de Contas da União por fraudes.

Propina é chamada de "deságio" pela organização

Menos de um ano depois, em março de 2009, a EIT conseguiu um contrato com a Petrobras no valor de R$500,9 milhões, em parceria com a Engevix, para tocar obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco.

Segundo o MP, Fernando Sarney uniu-se a Silas Rondeau, Astrogildo Quental e Ulisses Assad para fazer negócios envolvendo contratos públicos nos ramos do setor energético e de transportes. Nos contratos de subcontratação é cobrado o "deságio", que é, segundo o MPF, a expressão utilizada pelo grupo para denominar "propina", pois estes contratos englobam tanto a parte de pagamento pela execução das obras quanto o valor respectivo pela "ajuda" na obtenção do contrato.

Gianfranco e Flávio Lima figuram como sócios ou representantes de várias empresas, que serviriam para mascarar valores recebidos ilicitamente. Entre elas, a Planor Construções e Comércio Ltda, empresa envolvida no caso Lunus, Lupama Comércio e Construções Ltda, PBL Engenharia e Consultoria, e Proplan Engenharia. Segundo o MPF, à exceção da Planor e da Lupama, as outras empresas são fantasmas.

O advogado de Fernando Sarney não foi localizado.

(*) Especial para O GLOBO