Título: Empresas de fachada compraram TVs
Autor: Barbosa, Adauri Antunes; Freire, Flavio
Fonte: O Globo, 11/08/2009, O País, p. 11

Dinheiro de fiéis financiava negócios dos denunciados pelos promotores SÃO PAULO. Na ação aceita ontem pela Justiça, os réus são acusados de desviar dinheiro das doações dos fiéis da Igreja Universal para duas empresas de fachada controladas por Edir Macedo. Parte da arrecadação da Igreja Universal, de R$ 1,4 bilhão por ano, teria sido usada na compra de TVs, aeronaves e prédios.

O dinheiro proveniente de doações dos fiéis, em vez de de ser utilizado em benefício da igreja, era injetado nas empresas particulares dos denunciados, segundo a denúncia enviada à Justiça.

As duas empresas investigadas, a Cremo Empreendimentos S/A e a Unimetro Empreendimentos S/A, estariam envolvidas na aquisição de TVs, ligadas à Rede Record, com irregularidades que incluem até a falsificação de documentos. A Cremo recebeu pelo menos R$ 19,2 milhões; e a Unimetro, R$ 52,1 milhões, entre janeiro de 2004 e dezembro de 2005, segundo as investigações. Os repasses cresciam mais nos meses de janeiro e julho, quando a Universal realizava a campanha ¿Fogueira Santa de Israel¿ ¿ campanha para arrecadar doações de alto valor em troca de supostas graças.

As duas empresas são acusadas de terem feito repasses de dinheiro para a Investholding Limited e a Cableinvest Limited, localizadas em paraísos fiscais. Os mesmos montantes voltavam ao país sob a forma de contratos de mútuo, celebrados com laranjas. Na sede das empresas não há indício de atividade, segundo apuraram os procuradores.

As empresas Investholding e Cableinvest são representadas no Brasil por dois dos réus: Alba Maria da Costa e Osvaldo Sciorilli, executivos da Igreja Universal. Por parte da Investholding, as remessas de dinheiro a São Paulo foram feitas de agências do Banco Holandês Unido em Miami e Nova York. Já as remessas da Cableinvest foram feitas, em papel-moeda, para a empresa Câmbio Val, do Uruguai.

Edir Macedo já fora denunciado à 1aVara Federal de Itajaí (SC) por falsidade ideológica e uso de documento falso. Segundo a acusação, Marcelo Nascente Pires, bispo de confiança de Macedo, comprou ações da TV Itajaí Ltda, emissora da Rede Record, com empréstimos da Cremo, ligada à organização.

Pires foi sócio da TV Vale do Itajaí até 2001. Nessa época, Edir Macedo teria apresentado na Junta Comercial de Santa Catarina uma procuração adulterada, com dados que não correspondiam à vontade de Marcelo Pires e teriam sido inseridos depois que ele assinou o documento. O documento original era de 1996. Depois de 2001, quando Macedo teria posto Honorilton Gonçalves da Costa em seu lugar, foi feito exame pericial e se constatou que parte dos dados tinha conteúdo diferente.

Indícios de que fraude se repetiu em outras empresas De acordo com a ação que corre na Justiça paulista, há indícios de que o mesmo tipo de atividade criminosa possa ter ocorrido em outras empresas do grupo. Nos autos, os promotores incluem cópia de contrato particular de cessão de direitos celebrado por Odenir Laprovita Vieira e Edir Macedo, onde Laprovita transfere a Edir Macedo todas as ações da Rádio e TV Record S/A, TV Record de Franca S/A e TV Record de Rio Preto S/A.

O contrato estaria com data em branco.

Para explicar o uso das empresas na compra de TVs, o caso usado é o da TV Record do Rio de Janeiro. A emissora foi adquirida por seis membros da Igreja Universal, que justificaram a origem dos valores usados na transação (avaliada em US$ 20 milhões) com empréstimos junto à Investholding e à Cableinvest.

Ainda segundo as acusações, a Cremo foi usada para simular a compra e a venda de empresas, imóveis e até aeronaves do grupo. É o caso, por exemplo, da aeronave Cessna modelo 525 Citation Jet (série 525-0085) adquirida pela Cremo e repassada à Rádio Record por R$ 2,5 milhões, ou de um prédio localizado na Rua Visconde de Itaboraí 389, em Niterói, repassado pela Igreja Universal à Cremo.

O volume financeiro apresentado pelas comunicações envolvendo a Universal foi de R$ 8 bilhões, entre março de 2001 e março de 2008, de acordo com o Relatório de Inteligência Financeira n o441 do Conselho de Controle das Atividades Financeiras (Coaf).