Título: Obama quer tirar Cuba do foco
Autor: Fleck, Isabel
Fonte: Correio Braziliense, 08/04/2009, Mundo, p. 19

Cúpula das Américas

Estados Unidos manobram nos bastidores do encontro para contornar a pressão latino-americana contra o embargo imposto à ilha, que não participa da reunião. Havana envia chanceler a Brasília

Às vésperas do primeiro encontro de Barack Obama com líderes latino-americanos, o governo dos Estados Unidos sinaliza que pretende tirar Cuba do centro da discussão. O governo de Havana é o único do continente excluído da Cúpula das Américas, que se reúne em Trinidad e Tobago entre os dias 17 e 19 próximos, mas Washington sabe que sua relação com a ilha e a suspensão do embargo comercial certamente serão colocados em pauta por líderes sul-americanos. Para driblar a situação incômoda, a estratégia da Casa Branca é focar nos temas principais do documento final, como soluções para a crise econômica, fontes de energia limpa e segurança na região.

A pressão latino-americana pela reintegração de Cuba estará em pauta também na visita que o chanceler cubano, Bruno Rodríguez, faz hoje a Brasília. Ele tem encontro no início da tarde com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que reforçou o lobby pelo fim do embargo durante o encontro que teve com Obama no início do mês. A reunião, confirmada ontem à noite pela assessoria do Planalto, se segue a uma série de contatos entre os governos dos dois países e o país-sede da cúpula.

¿Cuba não faz parte, formalmente, da agenda (da Cúpula das Américas). Mas não há dúvida de que alguns países tentarão colocar essa questão¿, afirmou o representante dos EUA para a Organização dos Estados Americanos (OEA), Hector Morales, em entrevista a jornalistas brasileiros. Morales ressaltou, no entanto, que há ¿desafios muito significantes¿ no continente ¿ assuntos que mereceriam mais destaque do que a situação da ilha de Fidel Castro. ¿Há prioridades imediatas, como a crise econômica e financeira¿, disse.

De acordo com a agência de notícias Associated Press e o The Wall Street Journal, Obama também estaria se preparando para anunciar, antes da cúpula, menos restrições às visitas de cubanos-americanos à ilha e ao envio de dinheiro destes para suas famílias. A medida, que não foi confirmada por Morales, seria mais uma tentativa de acalmar os ânimos antes da reunião. ¿Obama já havia indicado, durante a campanha, que haveria uma flexibilização nas restrições para viajar a Cuba, assim como na transferência de dinheiro. Eu sei que ele vai fazer isso, mas não sei quando¿, despistou o representante na OEA.

Campanha Muito dos chefes de Estado que estarão em Trinidad e Tobago, como Lula, o venezuelano Hugo Chávez, o boliviano Evo Morales e a argentina Cristina Kirchner, já pediram publicamente a Obama o fim do embargo a Cuba. O governo da Costa Rica e o presidente eleito de El Salvador, Mauricio Funes, se uniram ao coro depois de decidirem reatar relações com a ilha. Agora, os EUA são o único país das Américas sem laços formais com Havana.

Mas nem tudo deve conspirar a favor de Cuba na Cúpula. Apesar do possível ¿bombardeio¿ dos líderes latino-americanos sobre o tema, o secretário-geral da OEA, José Miguel Insulza, descartou que seja aprovada uma resolução sobre Cuba, ou mesmo que a questão seja mencionada especificamente na declaração final do encontro (leia ao lado). De acordo com Insulza, o embargo imposto por Washington à ilha ¿é assunto dos Estados Unidos¿.

-------------------------------------------------------------------------------- Leia o projeto de declaração final da Cúpula das Américas (em espanhol)

-------------------------------------------------------------------------------- Declaração tem meta energética

Viviane Vaz Da equipe do Correio

A 5ª Cúpula das Américas começa daqui a nove dias, mas seu texto final já está pronto. O coordenador-geral do secretariado do evento, Luis Alberto Rodríguez, anunciou em Washington que representantes dos 34 países aprovaram a Declaração de Puerto de España. O rascunho final, de 97 parágrafos, é resultado de 10 sessões de negociação. Como representante do Brasil, participou da criação do esboço o diplomata Carlos Sergio Sobral Duarte. O documento inclui uma meta ousada para utilização de fontes alternativas de energia, prega a redução da pobreza pela metade até 2015 e o combate ao terrorismo.

¿Comprometemo-nos a aumentar a contribuição de energia provinda de fontes renováveis e de fontes de baixo teor de carbono para satisfazer, no mínimo, 50% da demanda energética primária a nível nacional até 2050¿, destaca o texto. A meta é a mesma traçada pela União Europeia. Em 2050, mais de 50% da energia empregada na UE deverá ser obtida de fontes isentas de carbono, isto é, não procedentes de combustíveis fósseis. No entanto, o bloco europeu tem ainda uma meta média intermediária de aumentar a porcentagem das energias renováveis em 20% para 2020.

O documento de conclusão da Cúpula das América inclui um prazo para que, até o fim de 2012, os países do continente planejem o desenvolvimento dos mercados energéticos com diversificação de tecnologias e melhoria da infraestrutura de transmissão. Até 2015, a região já deverá ter regras para comercializar combustíveis derivados de açúcar, algas e bactérias. ¿Formularemos estratégias para o cultivo e produção sustentável de biomassa, com particular atenção à necessidade de garantir a segurança alimentar¿, ressalta o rascunho. O texto prevê apoiar ainda o avanço do uso de turbinas eólicas, painéis solares, energia geotérmica e hidrelétrica. A parte financeira dos projetos deve receber o apoio e orientação do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Pobreza A declaração contém outras metas ousadas, como a de redução pela metade da pobreza até 2015, que coincide com os Objetivos do Milênio da ONU. Também promete promover o desenvolvimento do setor privado e zelar pela democracia. A organização não-governamental Anistia Internacional (AI) criticou a falta de espaço destinado aos direitos humanos e pediu o fim do embargo norte-americano a Cuba. Para a entidade, a política dos EUA em relação à ilha ¿impede os cubanos de desfrutarem dos direitos humanos e dos direitos à saúde, educação e moradia¿.