Título: Após 30 anos, Marina sai do PT e critica política ambiental de Lula
Autor: Braga, Isabel; Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 20/08/2009, O País, p. 10
Ex-ministra diz que é o primeiro passo para discutir filiação ao PV, não confirma intenção de se candidatar à Presidência e evita ataques diretos a Dilma, com quem teve embates
BRASÍLIA. A senadora Marina Silva (AC) se desligou ontem do PT, encerrando uma história de 30 anos no partido, para iniciar outra no PV. Evitando ataques diretos ao PT e ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a agora provável adversária da ministra Dilma Rousseff em 2010 disse que era o primeiro passo para discutir sua filiação ao PV. Cautelosa, não quis adiantar se concorda com as pretensões dos verdes de tê-la como candidata à Presidência da República.
A senadora disse que sai do PT para tentar realizar o sonho de ver a luta ambiental tratada como prioridade.
¿ Meio ambiente não deveria ser algo periférico, deveria ser algo transversal. Não é fácil para o governo Lula e para nenhum outro governo ¿ disse Marina.
Na carta enviada ao presidente do PT, Ricardo Berzoini (SP), ela acrescenta: ¿É uma decisão que exigiu de mim coragem para sair daquela que foi até agora a minha casa política e pela qual tenho tanto respeito, mas estou certa de que o faço numa inflexão necessária à coerência com que acredito ser necessário alcançar como novo patamar de conquistas para os brasileiros¿.
Marina foi ministra do Meio Ambiente no governo Lula por cinco anos e saiu em meio a pressões pela demora nas licenças ambientais de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), especialmente por parte de Dilma. Na carta, fez balanço de sua atuação, mas ressaltou: ¿Entendo que faltaram condições políticas para avançar no campo da visão estratégica, ou seja, de fazer a questão ambiental alojarse no coração do governo e do conjunto das políticas públicas¿.
Em entrevista, ela não polarizou com Dilma, mas indicou que na campanha o embate que teve com a ministra no governo se repetirá.
A ministra deve ser a mais afetada por uma eventual candidatura de Marina, já que a senadora
parte do eleitorado de Dilma.
¿ Nunca me colocaria em posição de vítima da ministra Dilma.
Por que transformá-la em algoz por defender seus pontos de vista? Investimentos não viáveis do ponto de vista ambiental não podem ser feitos.
Não entrou em detalhes sobre o apoio decisivo do partido para salvar o presidente do Senado, José Sarney, mas afirmou: ¿ Defendi o afastamento do presidente Sarney, para ter equidistância do processo de apuração.
Dentro da bancada sempre prevaleceu a posição à qual me filiava. A questão é grave.
Marina comparou a saída do PT à decisão tomada aos 16 anos de deixar o seringal Bagaço, interior do Acre, e ir para Rio Branco tratar da saúde e estudar.
¿ Isso para dar uma dimensão do que significa me desligar do PT. O fato de sairmos de casa não significa romper com as pessoas, mas encontrarmos maneira de continuarmos juntos em habitat diferentes.
Confrontada sobre o fato de o PV ser composto por muitos políticos não identificados com a causa ambiental, Marina demonstrou irritação. Segundo ela, o PV está se refundando para adequar-se à tese do desenvolvimento sustentável. E disse não buscar ¿lugares perfeitos¿: ¿ Todos os partidos têm problemas a serem saneados.
Para petistas, ela está fazendo jogo dos tucanos Sobre as críticas de que seria uma candidata monotemática à Presidência, ironizou: ¿ Talvez seja uma fragilidade de quem compreende o conceito (de meio ambiente).
Marina citou companheiros do PT com quem conversou, mas relatou que não falou com o presidente Lula. Agradeceu ao convite para ser ministra, mas deixou claro que dentro do PT não via mais como transformar a questão ambiental em algo central e não periférico. E recorreu a Lula para justificar sua saída: ¿ Imagino o que teria acontecido se Lula tivesse ficado no PMDB e não fundasse o PT.
¿ A causa ambiental vale por si mesma. Não acho justo que qualquer pessoa pense que há segundas intenções. Meio ambiente deve ser colocado como primeira intenção.
Os petistas lamentaram a saída de Marina. Muitos acreditam que, de forma ingênua, está fazendo o jogo dos tucanos e ajudando José Serra. O secretário-geral do PT, José Eduardo Cardozo, lamentou: ¿ É ruim para o PT e para ela. Espero que ela perceba isso e que reveja a decisão.
Para o deputado Antonio Carlos Biscaia (RJ) o desencanto com os rumos do PT pode ter levado Marina a essa decisão. Segundo ele, petistas enfrentam questões penosas no PT.
¿ Alianças são feitas em nome da governabilidade, mas a governabilidade não pode justificar tudo.
Para o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), Marina estava com a decisão amadurecida.
Diferentemente do que propôs o ex-ministro José Dirceu, a tese de pedir o mandato dela por infidelidade não encontra eco entre petistas. A decisão caberá ao diretório nacional: ¿ A Marina reconheceu avanços do governo Lula e do PT. Não vou tomar essa iniciativa.
Fernando Gabeira (PV-RJ) diz que a hora é de integrar às bandeiras ambientais os que já estão no PV, mas afirma que é preciso cuidado na escolha dos candidatos.
Para ele, é cedo para debater o vice de Marina. Afirmou que a legenda lançará candidato para tentar vencer: ¿ Se for para entrar (na campanha à Presidência) é para ganhar. Campanha simbólica faço desde 1986.