Título: Imposto descabido
Autor:
Fonte: O Globo, 22/08/2009, Opinião, p. 6

Como é da natureza do governo Lula gastar cada vez mais e descuidar-se da qualidade das despesas, a lógica oficial prescreve o aumento perene da carga tributária.

Explica-se, assim, a nova tentativa do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, com apoio do partido que o apadrinha, o PMDB ¿ e, claro, do PT ¿ , de ressuscitar a CPMF, derrubada no Senado no final de 2007. A alegação é a de sempre: mais recursos para a Saúde. Para os desavisados, um forte argumento.

Na realidade, um falso argumento, como demonstram a história fiscal do governo e a própria crônica da malfadada CPMF, criada ainda no governo Itamar Franco, em 1993, com o mesmo bom propósito, mas que, com o passar do tempo, desvirtuouse, financiou tudo menos hospitais e ambulatórios.

Não bastasse o desvio de função, a CPMF é um mau imposto, pois recai em cascata sobre todas as fases da produção de bens e serviços, onerando excessivamente a cadeia produtiva, um desestímulo ¿ mais um ¿ à criação de empregos, um fardo também para as exportações.

Quando foi extinta, a CPMF tinha uma alíquota de 0,38%, incidente sobre todas as operações financeiras.

Mas havia sido criada com 0,25%. O imposto, como reza a tradição brasileira, fora aumentado.

No orçamento para 2008, o governo contava com a arrecadação de R$ 40 bilhões via o gravame. Na luta para manter a contribuição, o presidente Lula e ministros assumiram um discurso catastrofista ¿ o fim da CPMF desmontaria a estrutura fiscal do Estado, o povo sofreria na rede pública de saúde etc. Balela, como se viu ¿ o sofrimento do povo continuou o mesmo. Com a economia em expansão e o aumento de outros impostos decretado em nome da compensação pela perda da CPMF, em quatro meses a Receita Federal havia arrecadado a mais os mesmos R$ 40 bilhões.

Tenta-se reproduzir a história daquele imposto na criação da Contribuição Social para a Saúde (CSS), nome do clone da CPMF. Como sua célula tronco, a CSS começaria com uma alíquota baixa (algo na faixa de 0,10%). Depois, não é difícil prever o que aconteceria. O embrião da nova CPMF foi inoculado na emenda à Constituição no29, que define os respectivos percentuais do orçamento que União, estados e municípios têm de destinar ao setor de saúde. Na primeira das duas votações, requeridas por emenda constitucional, ela foi aprovada por placar apertado. Vencida a segunda rodada de votação, faltarão outras duas no Senado. O governo prefere esta batalha política do que se debruçar sobre projetos que reduzam a indiscutível ineficiência dos hospitais públicos federais. Por exemplo, aprovando a transformação deles em fundações, para serem administrados dentro de normas comezinhas da boa gerência. Mas como o projeto das fundações, encaminhado pelo próprio Temporão, tem o veto de corporações sindicais, o governo volta a tentar impor mais este peso tributário à sociedade.

Outro caminho, não excludente, é transferir parte da copiosa gastança em custeio para a Saúde, despesa mais nobre para quem se diz preocupado com o povo.